Texto inédito das memórias de Francisco Guedes, pequeno agricultor duriense:
Vindima!Festa das colheitas!No meu tempo de rapaz a alegria que eu sentia ao avizinhar-se esta época festival!Fazia balões de côr,bandeiras e festões para engalanar o armazém e lagar depois de bem caiados,gostava de vê chegar as rogas-pessoal contratado de fora da Região-com um misto de alegria e entusiasmo para comer com eles,deitar-me nas mantas e rebolar-me com eles na melhor das brincadeiras e até raspanhar nos seus instrumentos de música!
No pessoal da minha roga-entre 10 a 15 pessoas-havia um anãozito que trazia uns bonecos presos numa cana que dançavam quando ele os puxava por meio de um arame interior.A graça que eu encontrava a isso!As estradas davam o aspecto de romaria;dançava-se,cantava-se e tocava-se até chegar à casa a que o pessoal se destinava.A mesma coisa sucedia de dia e de noite.No lagar a «pousa» de quatro horas de trabalho;na vinha ou no terreiro à noite era sempre festa!Os homens com os cestos vindimos às costas em fila indiana marcavam a cadencia do passo por meio de um pífaro ou apito e muitas vezes ao som do bombo e harmónio!Ninguém dava mostras de esgotamento físico!Sempre contentes e a sua alegria era contagiosa!Ao terceiro dia de corte de uvas era era a pousa no lagar, operação que envolvia uma fila de homens abraçados pisando a uva em ritmo certo dentro do lagar.
A pousa durava quatro horas de trabalho nocturno que se dividia em duas partes distintas a saber: primeira parte durava duas horas de trabalho a ritmo certo-especie de marcha militar que pouco se notava no deslocamento-porém muito forte na cadencia com que os calcanhares batiam no duro lastro do lagar.O que era o lagar?Um reservatório de comprimento variável, largura adequada e altura de uns 70 cm mais ou menos.Existiam lagares de 30 a 50 pipas.Na Região do Douro a pipa é de 550 litros,22 almudes de 25 litros.
A segunda parte da pousa, mais duas horas, era um trabalho de liberdade ou seja, o pessoal desliga-se e percorre o lagar a cantar e a dançar livremente!Nesta segunda parte cantava-se uma quadra muito em voga na pousas :
Liberdade, Liberdade
Quem a tem chama-lhe sua
Eu não tenho Liberdade!
Nem de pôr os pés na rua!...
Cantava-se, dançava-se e tocavam-se toda a casta de instrumentos,desde o bombo,ferrinhos, flauta,harmónio,concertina e outros instrumentos metálicos de qualquer banda musical da qual se destacassem meia dúzia de entusiastas para irem animar a vindima e ganhar algum.
Se o vinho trabalhado nessa noite se destinava a vinho generoso-o que equivalia a dizer futuro vinho do Porto-então aproveitava-se toda a doçura ou seja todo o acúcar do mosto e para isso tinha que se deixar subir a manta-conteúdo de peles,cangaço e grainha-que pela força alcoólica do mesmo vinho impele a mesma a subir à superfície.Neste caso abre-se o lagar e transporta -se imediatamente pelo caneco ou, modernamente pelas bombas eléctricas, esse vinho para o tonel, cuba, balceiro....
Aqui leva uma percentagem de aguardente vínica que depois será completada com outra dose, mercê de uma transfega ou lôta a meados de Novembro
Depois este vinho irá para as pipas, toneis ou cubas de castanho onde envelhecerá e então lá diz o ditado:«vinho e amigo o mais antigo»Este vinho enobrecer-se-á à medida que eu envelhecer!
1 comentário:
Como faço para ser contratado para as vindimas, este ano?
Abraço!
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