Um recente estudo
encomendado pela Associação Sindical dos trabalhadores dos impostos «revela que o ambiente
laboral na Autoridade Tributária e Aduaneira Portuguesa enfrenta desafios
significativos, com elevados níveis de stress ocupacional, exaustão e
insatisfação entre os colaboradores. Os dados demonstram que o
excesso de trabalho, as preocupações com a carreira e a remuneração são fontes
proeminentes de stress. Além disso, uma parte considerável dos colaboradores
expressa intenções de deixar a organização.»
As conclusões mostram que existe um stresse ocupacional relacionado com a
carreira e a remuneração, mais de 76% dos inquiridos! Os níveis de bournout/exaustão
quase atingem os 80%.
O estudo infelizmente pode ser consultado em inglês, existindo apenas um
resumo em português na página web daquela associação sindical!O objetivo é
sensibilizar o poder político para as condições de trabalho destes
profissionais do Estado e ainda a opinião pública.
O poder político é pouco sensível às condições e qualidade do trabalho
Todavia, tal como aconteceu com outros estudos sobre as condições de
trabalho de outras classes profissionais, enfermeiros,médicos e professores ou
mineiros,o poder político pouco ou nada se sensibiliza com as conclusões dos
mesmos e a opinião pública não muda a sua perceção negativa sobre os
funcionários públicos.
Procurar as razões desta situação tem sido trabalho de vários
investigadores sociais e uma das conclusões terá a ver com a maneira de como
encaramos o trabalho dependente e, neste, as classes mais ou menos valorizadas
pela população.Trata-se de uma questão cultural complexa para os sociólogos
aprofundarem mais!
Antes de mais quase todos estamos aparentemente imunes ao sofrimento no
trabalho, ao nosso e ao alheio!Quando nos queixamos ao patrão ,aos colegas e
familiares quase sempre o fazemos com muito pudor e quase vergonha.Por outro
lado, quase não sentimos grande solidariedade da parte destas pessoas: o patrão
desconfia das nossas queixas,os colegas atiram-nos à cara as queixas maiores
deles e os familiares mandam-nos ao médico de família.E mesmo este raramente
nos manda falar da nossa profissão e das condições em como a executamos.
Temos a ideia formada de que o sofrimento no trabalho é normal!
Temos na nossa cultura, de raízes cristãs, como dado adquirido que o
trabalho contém sempre um esforço, um suor no rosto!A percepção geral é a de
que o trabalho,ou a maioria dos trabalhos, são penosos!Efetivamente sabemos que
há um certo nível de erosão, de desgaste corporal e espiritual no exercício de
qulquer profissão.Mas também temos a experiencia de que nos sentimos por vezes
bem felizes com o trabalho realizado.
Generalizou-se assim a ideia de que o sofrimento no
trabalho,independentemente do grau desse sofrimento, é normal!Quem se lamenta
demonstra uma fraqueza,pouca resiliencia como agora se diz.Em geral
culpabiliza-se a pessoa, o trabalhador, o gestor que não tem condições físicas
ou psicológicas.O sistema empresarial oferece receitas individuais para superar
o stresse,para ganhar resiliência,desde o yoga até ao ginásio,dias de férias
extra, horários flexíveis etc.Fica sempre no ar a ideia de que o problema está
na nossa pessoa e não na empresa e no ambiente de trabalho da mesma.
Todavia, perante a intensidade do trabalho e a carga psicológica do
trabalho moderno, alicerçado nas modernas tecnologias,em que quase não existe
fronteiras entre o trabalho e a nossa vida,todas as receitas
individualistas pouco adiantam.É um
gastar de dinheiro e tempo inútil!
Hoje a causa principal do sofrimento no trabalho é a intensificação da
exploração
A questão principal está na organização e gestão moderna do trabalho
imposta pela intensificação da exploração capitalista!As grandes empresas
multinacionais,com acionistas desconhecidos, exigem resultados aos seus
gestores pagos a peso de ouro perante a competição mundial e a necessidade de
aumentar os resultados.Estes,por sua vez, exigem resultados e objectivos
irrealistas aos trabalhadores,fazem uma gestão empresarial perdedora e doentia
aumentado a intensificação do trabalho e
reduzindo o pessoal;chefias e trabalhadores tornam-se descartáveis e avaliados
de forma discricionária;as carreiras são destruidas em nome da polivalencia e
flexibilidade!
Por vezes até recrutam médico do trabalho, psicólogos e organizam serviços
de segurança no trabalho,previstos na lei, que se sentem impotentes perante as
novas ameaças à saúde.Estes serviços estão claramente em crise!
Os serviços públicos entraram pelos caminhos da gestão privada!Menos pessoal,mais
trabalho e maior complexidade de organização com as tecnologias modernas.O que
acontece na Autoridade Tributária acontece noutras autoridades e serviços.As
pessoas sentem-se maltratadas, não reconhecidas, sem o evoluir normal de uma
carreira,sem salários que permitam uma vida digna!Entrar de férias ,em vez de
permitir um descanso normal pode tornar-se um pesadelo no regresso com trabalho
não realizado e amontoado.Os mais velhos sentem-se especialmente maltratados
com chefias muito jovens e arrogantes que entraram pela via do cartão
partidário!
Não se mudando a forma de trabalhar, em particular a organização do
trabalho, estamos a criar organizações públicas e privadas doentes,fábricas de
stresse e bournout.O facto de pouco se
falar nestas magnas questões ainda torna o problema mais grave!Veja-se os
programas dos principais partidos,nomeadamente no governo.Nada, ou quase nada,
aparece sobre estas matérias tão importantes para a nossa integridade física e
mental!
Neste quadro a responsabilidade das organizações sindicais é grande!Todas
as organizações de trabalhadores terão que colocar esta questão-a saúde dos
trabalhadores-numa questão prioritária!
No dia 28 de Abril comemoramos todos os anos o Dia Mundial da Segurança e
Saúde dos trabalhadores,uma efeméride da iniciativa do Movimento Sindical
Mundial e da Organização Internacional do Trabalho.Lutemos unidos pela nossa
saúde!Lembremos os milhões de trabalhadores mortos por acidente e doença
pofissional!
Nota: Este artigo foi inicialmente publicado na página da BASE-FUT
www.basefut.pt