terça-feira, 18 de janeiro de 2022

TRABALHO-o grande ausente das eleições legislativas 2022

 

Numa rápida espreitadela aos programas eleitorais e alguma atenção aos debates da pré -campanha eleitoral e percebemos que o trabalho e as mudanças tão ameaçadoras que se operam no mesmo estão completamente secundarizadas e até subvalorizadas, como,aliás tem acontecido nas anteriores eleições legislativas.Embora sem destaque especial a CDU e o BE ainda destacam algumas propostas laborais tradicionais como  a redução do horário de trabalho para as 35 horas, o combate à precariedade e a valorização salarial.O PS embrulha algumas das medidas da Agenda para o Trabalho Digno no capítulo da demografia, mostrando especial preocupação com a situação dos jovens trabalhadores.

Dos partidos da direita nem valerá a pena falar pois para eles o trabalho insere-se no capítulo da economia, na linha do que fazem hoje a maioria dos jornais e revistas económicas.O próprio PS há muito que nos seus programs eleitorais o trabalho não tem autonomia.Aparece nos capítulos da economia ou do social.

Semana de quatro dias?

No entanto, seria o PS a lançar, embora de forma pouco convicta, a principal novidade destas eleições no campo das relações de trabalho: a semana de quatro dias.Nota-se infelizmente que a medida não foi suficientemente trabalhada pois não apresenta uma estratégia para a implementar,se apenas no sector público ,se também no privado e em que ano.

Pelo contrário a questão climática e digital é objecto de grandes capítulos nos programas eleitorais de quase todos os partidos e dos discursos de alguns líderes.São questões na moda tanto a nível de Portugal como em todo o mundo e pelas quais se interessam em especial as camadas mais jovens da população.

Alguns políticos desculpam-se que as questões do trabalho devem ser debatidas e negociadas com os parceiros sociais no forum da Comissão de Concertação Social.Não passa de uma desculpa de mau pagador.Verdadeiramente para a maioria dos políticos o trabalho é uma componente económica e está submetido á competitividade, ao mundo empresarial .É assim que pensam as grandes organizações internacionais como a OCDE,FMI, Banco Mundial e Comissão Europeia.A própria social democracia europeia alinhou e alinha por este diapasão, apesar dos dissabores que já teve e tem em termos eleitorais.

No trabalho foram e são aplicadas as receitas da direita

Quando foram para o governo a maioria aplicou ao mundo do trabalho as receitas da direita europeia, as directrizes da competitividade, com horários desregulados, flexibilidade, avaliações de desempenho, trabalho por objectvos, desvalorização das carreiras, contenção salarial.Os resultados estão á vista com as desigualdades a aumentarem nas últimas décadas.

Apesar de tudo a experiência  portuguesa de governação de 2015-2019, um governo do PS com apoio das esquerdas parlamentares,tentou remar contra essa maré, em particular com a valorização do salário mínimo, retirando-o em grande medida da concertação social .No entanto, a questão do trabalho, em particular a reversão das medidas da troika, foi sempre um caroço que o PS nunca digeriu.

Ou seja, as questões do trabalho, nomeadamente as medidas que podem distribuir mais a riqueza como as indemnizações por despedimento, trabalho suplementar e valorização salarial devem estar submetidas a uma forte contenção, quer em tempos de vacas gordas (2016-2019) quer no tempo de vacas magras (2020-2022).

Os sindicalistas podem fazer mais

Assim sendo, estamos destinados a uma periferia geográfica e do progresso económico e social?De facto o nosso tecido económico vai mudando muito lentamente.Ainda está muito baseado nas indústrias tradicionais e no turismo, em pequenas empresas pouco podutivas, etc.Sentimos que as empresas portuguesas  não absorvem as novas gerações qualificadas, não lhes pagam de forma incentivadora e com perspectivas de futuro.Em Portugal temos engenheiros em empresas de ponta como a aeronáutica a ganharem pouco mais de mil euros!Do que estão á espera estas empresas?Que os melhores pensem em emigrar logo que tenham uma oportunidade!

Mas, perante esta desvalorização política, económica e social do trabalho os sindicatos também podem fazer mais.Os próprios sindicalistas pulverizam as listas partidárias em posições não elegíveis;são poucos os sindicalistas na Assembleia da República e nos órgãos de decisão dos partidos e a sua influência é reduzida, inclusive nos partidos de esquerda.É fundamental uma maior autonomia sindical face aos partidos políticos e não uma tão grande submissão.
.É inaceitável que o trabalho,no qual passamos uma grande parte da nossa vida, esteja a ser uma questão secundaríssima nos debates, nos programas políticos e nas políticas efectivas.

segunda-feira, 3 de janeiro de 2022

TRABALHADORES RESILIENTES OU TRABALHADORES RESISTENTES?

 

O conceito «resiliente» ganhou espaço na linguagem diária e é assumido sem qualquer crítica em vários


tipos de discurso.Embora com origens remotas do latim e na física o conceito ganhou força nos últimos tempos nas áreas da gestão, da política e da psicologia.

Gestores e políticos  tem vindo a popularizar o conceito falando em organizações e pessoas resilientes, ou seja, pessoas e organizações flexíveis, que se adaptam com sucesso ao meio ambiente, ao trabalho e a circunstâncias dificeis como a que estamos a viver com a actual pandemia.

A resiliência tornou-se assim numa peça chave da ideologia neo-liberal que exige flexibilidade total às pessoas para que as empresas, no discurso gestacional, possam enfrentar com sucesso a competição num mundo onde impera a incerteza, a volatilidade e a complexidade.Algumas empresas proprocionam inclusive formação em resiliência aos trabalhadores com formadores bem pagos que pregam a adptação a resignação e a flexibilidade.Na UE e nos grandes organismos internacionais escrevem-se programas e planos de recuperação e resiliência

É assim que o discurso dos gestores e políticos enaltecem os cidadão e trabalhadores resilientes, que perante uma crise são capazes de se superarem, de abdicarem de direitos e regalias sociais conquistadas com muito suor e sangue.São louvados os trabalhadores resilientes e marginalizados e até despedidos os trabalhadotres resistentes que na linguagem empresarial não se adaptam ás circunstâncias das crises, que resistem à flexibilidade total que querem um trabalho para a vida e permanente, negociação colectiva e direitos laborais e sindicais.

Nesta abordagem empresarial não se atacam, e até se escamoteiam, as causas profundas do mal estar no trabalho na economia capitalista;evita-se falar em prevenção dos riscos psicossocaiis no trabalho,esconde-se e não se aceita que muito do mal estar está na organização do trabalho , na carga mental e física, na precariedade, nos baixos salários e na falta de conciliação entre vida profissional e familiar.

Por incrível que pareça nestas abordagens gestionais e psicologistas as causas dos problemas do trabalhador deprimido ou stressado está no próprio trabalhador que não é suficientemente resiliente, não consegue superar o stresse e a doença.Devem ir ao ginásio, devem ouvir com atenção as palestras dos chefes e gestores, devem cultivar a estabilidade emocional.

Frequentemente o trabalhador acaba por se culpabilizar e adoecer numa espiral de terror contagiando a própria família.O trabalhador acredita que ele não é competente, não é resiliente, não é dos eleitos.Máxima perversão do capitalismo:explora e adoece o trabalhador numa economia que mata e consegue culpabilizar o trabalhador por se encontrar nesta situação.

Assim perante a ideologia da resiliência há que levantar a proposta da resistência e luta por um trabalho digno e saudável.Resistir nas empresas e no teletrabalho exigindo os direitos laborais e sindicais.Resistir e reconstruir as nossas organizações, os nossos colectivos.Resistir  colectivamente e´uma excelente terapia.