terça-feira, 21 de junho de 2022

A SEGURANÇA E SAÚDE DOS TRABALHADORES É DIREITO FUNDAMENTAL, E AGORA?

 

A 110ª Conferência Internacional do Trabalho (CIT) realizada neste mês de junho em Geneve, Suiça,


aprovou uma Resolução que junta  um ambiente de trabalho seguro e saudável aos quatro Principios e Direitos Fundamentais  no Trabalho já existentes:liberdade de associação e negociação colectiva; eliminação de todo o trabalho forçado ou obrigatório; eliminação efectiva do trabalho infantil  e a eliminação da discriminação no trabalho e no emprego.Estes principios e direitos integram a Declaração da OIT de 1998 a que todos os Estados membros se obrigaram a cumprir.

Claro que esta Resolução pode não passar do papel em muitos países se o Movimento Sindical Mundial e  outros movimentos sociais e cívicos não continuarem o seu trabalho neste domínio.

Todavia, a OIT tem um conjunto de meios para verificar se os Estados  cumprem ou não as suas decisões.A partir de agora saíram reforçadas as convenções da OIT sobre esta matéria, nomeadamente a Convenção 155 sobre a segurança e saúde dos trabalhadores ,bem como a Convenção 187 sobre o quadro de promoção da segurança e saúde dos trabalhadores.

Os Estados membros da OIT vão ter que responder perante esta Organização e a comunidade internacional se cumprem nos locais de trabalho o direito fundamental á segurança e saúde dos trabalhadores, um direito aliás constitucionalmente garantido em Portugal.Cada Estado fica agora com uma obrigação acrescida no garantir este direito fundamental a par dos outros quatro direitos fundamentais.

Hoje em dia nas nossas sociedades, apesar de muito anestesiadas quanto ao sofrimento no trabalho,qualquer pessoa fica escandalizada quando se noticia a existência de trabalho forçado ou escravo.Infelizmente o mesmo não acontece porém , quando trabalhadores morrem em acidentes de trabalho ou de doença ocupacional, estão expostos ao assédio ou estão em esgotamento.

Esta Resolução vai obrigar a que os Estados melhorem as suas políticas de prevenção dos riscos profissionais, em particular os sistema de proteção da sáude dos trabalhadores que em alguns países, inclusive europeus, são miseráveis.

Mas também a melhoria dos sistemas inspectivos que passam por grandes dificulades de modernização e adaptação ás profundas mudanças laborais, nomeadamente em Portugal.

A Estratégia Nacional para a Segurança e Saúde no Trabalho 2022-2027, que ainda não  viu a luz do dia, deve já assumir esta nova realidade e há que rever a legislação nacional nesta matéria, nomeadamente no que respeita aos serviços de segurança e saúde nas empresas que, em larga medida, são um «faz de conta», basta falar com meia dúzia de trabalhadores de meia dúzia de empresas.

Mas esta Resolução é também um enorme desafio para o Movimento Sindical  e outras organizações de trabalhadores que vaõ ter que colocar a Segurança e saúde dos trabalhadores no coração das suas reivindicações e lutas, nomeadamente na negociação colectiva onde tem havido pouca inovação, para alem do que diz a lei.

A Resolução da OIT é antes de mais uma vitória do movimento sindical, mas também um efeito da pandemia da Covid 19 que mostrou quão impreparados estavam e continuam a estar os locais de trabalho para enfrentar os riscos .

quarta-feira, 8 de junho de 2022

DESLIGAR DO TRABALHO É MAIS DO QUE UMA QUESTÃO JURIDICA

 

Tem havido nos últimos tempos um debate muito interessante sobre o «direito a desligar ou


desconexar» do trabalho.Um debate muito jurídico mas também de análise sociológica e sindical.A França foi talvez um dos primeiros países a colocar a questão em lei e este ano ,no quadro do diploma 83/2022, sobre o teletrabalho, integrou também o nosso quadro jurídico sob a denominação de obrigação da entidade patronal em não ligar ao trabalhador no tempo de descanso deste.O direito do trabalhador exige assim uma obrigação patronal.

No entanto temos que reconhecer que na prática esta obrigação patronal vai ser muitas vezes violada com inúmeras justificações e, num quadro de precariedade, o trabalhador não tem coragem de não atender o chefe ou patrão a qualquer hora.Ou seja, por razões objectivas este direito pode ter poucas condições para se efectivar.

Por outro lado, são muitos os trabalhadores que não desligam e não são capazes de se desligar do trabalho e dos seus problemas profissionais.Por vezes, ouvimos alguns colegas afirmarem que deixam todas as questões do trabalho á porta do mesmo.São uns felizardos!

Todavia, também existem muitos trabalhadores que transportam para casa todos os problemas que têm com as chefias ou com os colegas,o ambiente competitivo e pouco saudável que existe no local de trabalho,os conflitos sociais, como greves, doenças, absentismo,etc.Basta que um ou dois colegas entrem de baixa para que a equipa se ressinta, aumente o trabalho, aumente a crispação.Mesmo que o patrão ou chefe não nos ligue estamos com o trabalho na cabeça.Uma angustia se apodera de nós

Por outro lado,as novas tecnologias, que de certa maneira são uma maravilha do nosso século, principalmente com a internet,comportam frequentemente novas escravidões.É o whatsApp,os mails, as redes sociais.O chefe cria um grupo de whatsApp,manda uma notícia para o face a fazer um aviso, um apelo, etc.

O nosso trabalho, do qual cada vez queremos falar menos,apodera-se do nosso cérebro da nossa vida, ao mesmo tempo que temos dificuldade em nos distanciarmos desta rede que nos enreda.A competição e os sistemas de avaliação isolam-nos, fazem-nos desconfiar dos colegas;o discurso do sucesso e meritocrático tornam-nos inseguros porque não conseguimos atingir os objectivos, subir a pulso, ser o máximo.Podemos passar a uma fase de esgotamento ,de «bournout» de doença, num ciclo vicioso que alguns quebram da pior maneira, ou seja, com a baixa prolongada ou o suicidio.

Saber desligar do trabalho cada vez é mais difícil.Com o teletrabalho a situação vai piorar na medida em que a nossa casa passa também a ser um local de trabalho.Casa e trabalho confundem-se, para alguns é a liberdade mas para outros, é a confusão,o não distanciamento entre a vida familiar e profissional!

Realmente o direito a desligar é muito mais que uma questão jurídica,é uma questão existencial, é mais do que o direito a descansar.Na medida em que o trabalho se torna cada mvez mais imaterial mais problema temos em desligar, em separar o trabalho da vida social e familiar.

Estamos a passar a uma fase em que o trabalho mais árduo e monótono deve ser realizado por máquinas e aos humanos deve ser reservado o trabalho mais criativo, mais humano, mais nobre.Uma fase em que se deve trabalhar menos horas e muito mais bem pagas!

Mas no capitalismo  esse tipo de trabalho, com menos horas e bem pago será sempre reservado a uma minoria que coexiste com uma maioria de gente mal paga, trabalhando de forma flexível e nos piores trabalhos ou na situação de desempregado.

domingo, 5 de junho de 2022

SOBRE UM APELO À CONVERGÊNCIA SINDICAL

 Nos últimos dois anos e apesar de passarmos por uma terrível pandemia, e agora por uma


guerra,não se vislumbram ações significativas de convergência/diálogo sindical entre as duas maiores organizações sindicais portuguesas.

Tanto no campo da CGTP como da UGT o que se ouve é um silêncio ensurdecedor ou um ou outro remoque ou diatribe, muito mais até no campo da segunda do que na primeira.

No último congresso da UGT, porém ouviu-se um corajoso apelo ao diálogo e convergência de ação sindical por parte de Fernando Gomes que estava a representar a corrente socialista da CGTP naquele congresso.Julgo que em ambos os campos o apelo caíu em saco roto.

No entanto, é uma tomada de posição que julgo ter eco em centenas de sindicalistas que estão dispostos nos locais de trabalho a convergir cada vez mais na defesa dos direitos e interesses dos trabalhadores.Só que por razões estratégicas diferentes os partidos com influência sindical não fomentam essa convergência.Objectivamente quem perde são os trabalhadores portugueses,a maioria dos quais nem militante é de qualquer partido.Os banqueiros e os acionistas dos grandes grupos económicos podem dormir descansados.

Se com Arménio Carlos a política era ignorar a UGT sem recusar uma ou outra  ação em conjunto, organizada por sindicatos filiados ou afectos,com Isabel Camarinha esta política endureceu um pouco mais.Por seu lado, o ex-secretário geral da UGT, Carlos Silva, não desperdiçou nenhuma oportunidade para dar uma «bicada» na CGTP.Vamos ver a orientação do Mário Mourão, o novo secretário geral recentemente eleito.

Chegados aqui podemos concluir que nem a pandemia,nem os efeitos nefastos de uma guerra, nem as condições difíceis em que actualmente se movem os sindicatos no quadro de uma globalização injusta conduzem a curto prazo à superação das fracturas históricas  do movimento sindical português.O que muitos trabalhadores se questionam é o que será preciso mais para que vejamos uma mudança desta situação.

Sim,porque são muitos os trabalhadores que já nada esperam do movimento sindical nesta matéria, apesar de ainda se gritar nas manifestações «Unidade Sindical!».Mas são também muitos os que esperam uma mais forte convergência de ação para defender valores e direitos essenciais que são a base do trabalho digno e de uma sociedade democrática e que o capitalismo actual já demonstrou não estar disposto a respeitar na sua essencia.

O capitalismo das multinacionais ,da Amazon, da Tesla e das grandes plataformas digitais trabalham para um regresso ao passado mascarado de futuro, onde largas camadas de trabalhadores atomizados, sem organização,sejam os novos escravos de uma sociedade onde impera a desigualdade, o trabalho á hora ou á peça, por encomenda e sem qualquer regulação.

Os dirigentes da UGT e da CGTP têm uma pesada responsabilidade na hora actual que é irem ao encontro dos anseios de muitos trabalhadores que ainda estão nos sindicatos.

Apesar da história, é um facto que a UGT nasceu contra a CGTP,apesar da concorrência sindical no terreno,com atropelos vários, nomeadamente na negociação colectiva, apesar do sectarismo existente nos dois campos, o sindicalismo português tem que se articular melhor no futuro promovendo plataformas de entendimento para as lutas que se avizinham e para as quais somos todos necessários.Assim não vamos lá!

Não há muitas escolhas neste capítulo.Ou o sindicalismo português supera as divergências e luta  de forma cada vez mais unida e eficaz, proporcionando melhores condições de trabalho e de vida a quem trabalha, ou os trabalhadores ainda sindicalizados vão abandonando os sindicatos ou nem neles se filiam, no caso dos mais jovens.