Emprego. Numa década, o número de empregados com contratos a prazo e vínculos atípicos cresceu 52%. No final do ano passado, o emprego caiu e o número recuou.
O emprego precário - contratos a termo, prestação de serviços, sazonal e pontual - tem vindo a subir em número e em peso.
No ano passado atingiu já 902 mil pessoas. Um aumento de 52% em 10 anos. Este valor absoluto foi calculado pelo DN a partir da informação publicada pelo Instituto Nacional de Estatística (INE) e com base no conceito de trabalho "não permanente" utilizado pelo professor António Casimiro Ferreira, num estudo que hoje é divulgado, no âmbito de uma iniciativa organizada pela UGT. No relatório preliminar do documento "Da sociedade precária ã sociedade digna: balanço da evolução social em Portugal", o professor da Universidade de Coimbra mostra que o peso destas situações sobre o total de pessoas empregadas tem vindo a crescer,passando de 12,3% em 1998,para 17,4% em 2008. As mulheres são geralmente mais afectadas. Por outro lado, o Alentejo apresentava o valor mais alto (23,9%),seguido do Algarve (23,1%) e da região de Lisboa (21,1%)."A desestabilização dos estáveis e dos instáveis tende a constituir-se num modelo de regulação ^que, caso venha a institucionalizar-se como modelo normal de relacionamento entre empregadores e trabalhadores conduzirá ao aumento da insegurança económica e social",escreve o autor,nas conclusões do estudo. António Casimiro Ferreira alerta para a vulnerabilização de territórios, jovens e mulheres. Além da flexibilidade legal,"discutivel no plano dos principios e das consequências práticas", o caso português evidencia" sinais preocupantes" quanto ã existência de trabalho à margem das normas, acrescenta o autor.
Dos 902 mil indivíduos que o DN considera, 727 mil têm contratos a prazo, enquanto os restantes apresentam formas mais atipicas de trabalho. Os dados de 2008 apontam para 174 mil pessoas. Neste segundo grupo incluem-se pessoas que apesar de terem contratos de prestação de serviços são consideradas "trabalhadores por conta de outrem"; individuos em "trabalho sazonal e sem contrato escrito" ou em situações de trabalho pontual.São estas as pessoas mais expostas ao risco de desemprego. Os dados do Instituto de Emprego e Formação Profissional (IEFP) revelam que os despedimentos unilaterais ou por mútuo acordo estão a ganhar protagonismo, tendo explicado já cerca de um quarto das novas situações de desemprego em Janeiro. Apesar disso, o "fim de trabalho não permanente" continua a ser a principal causa de inscrição nos centros de emprego. Que inclui a não renovação de contratos a prazo ou a interrupção de contratos mais precários.O conceito de precariedade aqui considerado exclui todos os trabalhadores por conta própria. Parte deles terão contratos de prestação de serviços, tal como explica Casimiro Ferreira no estudo que hoje será apresentado.
Recuo no final do ano
Os dados relativos a todo o ano de 2008 têm a vantagem de diluir alterações pontuais, mas escondem a redução do peso dos vinculos mais precários na segunda metade do ano.Os contratos considerados neste conceito de precariedade registaram o ponto mais alto no segundo trimestre do ano, com 925 mil pessoas incluidas, mostram os dados do INE.Desde então, a economia tem vindo a destruir emprego e o número tem vindo a cair: recuou para 901 mil pessoas no terceiro trimestre e 882 mil no final do ano.
Ao mesmo tempo, e numa altura em que o emprego caiu, aumentou o número de pessoas com contratos sem termo.Uma inversão recente que pode ser explicada pela análise sectorial: Educação e Administração Pública continuam a criar emprego, em contraciclo com o resto da economia.Mulheres seguram empregoDisparidades. É a outra face da progressiva entrada do sexo feminino no mercado. O número de homens empregados caiu, nos últimos dez anos As mulheres ainda são minoritárias no mercado de trabalho mas representavam, no ano passado, uma fatia de 46,2% de toda a população empregada, contra 45% em 2000, segundo dados apresentados no estudo de António Casimiro Ferreira.Entre 1999 e 2008, o crescimento do emprego apresentou taxas muito reduzidas, sobretudo devido à evolução da população masculina, que, em quatro dos dez anos analisados, apresentaram taxas de variação negativas."O crescimento do emprego é sustentado principalmente pelo emprego feminino", conclui o autor.
Cálculos do DN mostram que nesta década o emprego entre os homens cresceu, em média, 0,3%. Já entre as mulheres não parou de crescer, para atingir a taxa média de 1,1%.Por classes de idade, revela o estudo realizado por António Casimiro Ferreira, deu-se uma redução significativa da percentagem de empregados jovens entre os 15 e os 24 anos,"a que possivelmente não será alheia a entrada mais tardia no mercado de trabalho, devido ao prolongamento dos estudos". Já no escalão de maiores de 45 anos, a tendência é inversa e regista um crescimento sustentado.A maior dinâmica de criação de emprego feminino não tem garantido às mulheres as melhores condições de trabalho.
Dados do INE referentes ao ano passado mostram que as mulheres ganham, em média, 81,9% do que ganham os homens, e que esta proporção está a cair há dois anos, consequência da maior exposição á precariedade. Catarina Almeida in Diário de Notícias