terça-feira, 29 de setembro de 2020

TELETRABALHO? Sim e não, obrigado!

 

Com a pandemia o trabalho à distância aumentou de forma considerável em países que não tinham esta


prática ainda de forma relevante como é o caso de Espanha e Portugal,Refiro-me em particular ao teletrabalho de trabalhadores por conta de outrem .Actualmente e em todos os países o teletrabalho forçado abrange milhões de trabalhadores europeus.No ínício as empresas tinham em geral algumas reticencias quanto ao empenho dos trabalhadores e à produtividade em geral.Agora, com as primeiras avaliações já se cantam loas ao teletrabalho por parte do patronato e dos  comentadores.Em muitas empresas os trabalhadores viram-se forçados a trabalhar mais do que trabalhavam nos locais de trabalho presenciais e, em muitos casos, a cuidar dos filhos e netos e  a pagar a luz e a água por sua conta, para além de trabalharem em espaços familiares sem as  condições ergonómicas e de saúde básicas.

Alguns inquéritos revelam que apesar de tudo o teletrabalho mereceu a adesão de muitos trabalhadores, em particular nos países onde já tinha tradição como nos países nórdicos.A continuação da pandemia vai ainda generalizar o teletrabalho em alguns sectores e noutros será alternado com o presencial.Recentemente dois sindicatos em Espanha, CCOO e UGT, acordaram com o patronato e o governo legislação sobre a matéria não inteiramente satisfatória segundo outros sindicatos como é o caso da Unión Sindical Obrera (USO).

Em Portugal o tema já está em debate, particularmente a nível sindical.Qualquer regulamentação a fazer deve ser devidamente preparada e debatida sendo fundamental a participação dos sindicatos.

Como não posso aqui fazer um grande tratado sobre o trabalho à distância, não apenas em casa mas nas plataformas digitais, abordando todos os inconvenientes e vantagens lembro apenas duas questões fundametais: uma é a alteração profunda dos locais de produção e as suas consequencias para os trabalhadores e suas famílias e outra é os desafios sindicais que o teletrabalho coloca.

Com efeito o teletrabalho em massa e sem regras firmes levaria os centros produtivos das empresas para casa dos trabalhadores.A  casa  da família passaria a ser uma extensão da empresa da mulher e do homem e até de um filho ou filha que também trabalhem e ainda vivem com os pais.As entidades patronais entrariam na privacidade da nossa casa durante um tempo bastante largo do dia ou da noite e os trabalhadores ainda estariam mais dominados do que os operários que viviam em casas do patrão nas grandes quintas agrícolas ou grandes empresas do passado século.

Tal situação daria origem a uma regressão social sem precedentes ao acantonar e isolar os trabalhadores, destruindo-lhe o reduto familiar tornando os seus lares em centros produtivos e sem barreiras entre o trabalho e vida familiar e social acentuando perversas tendencias já existentes de não desconexão e de viver para trabalhar.

Tal realidade alteraria o actual quadro de relações laborais e acabaria por liquidar o que resta da contratação colectiva em muitos países.Dái que seja muito importante em qualquer regulação prever a sindicalização e participação sindical dos trabalhadores e a ação dos sindicatos.Por outro lado , o teletrabalho nunca poderá ser a relação de trabalho dominante.Para além de voluntário deve ser alternado com a presença nos locais físicos da empresa.

quarta-feira, 2 de setembro de 2020

Polémicas ideológicas de verão: a direita conservadora contra ataca!

 Os últimos dias de agosto e os primeiros de setembro têm sido férteis em debates e querelas político-ideológicas que, tendo a sua importância estão longe dos principais problemas do País que são a pandemia e saúde, a economia e o desemprego.

Refiro-me concretamente à realização da Festa do Avante e ao manifesto «Em defesa das liberdades de educação» assinado por várias pessoas bem conhecidas  como Cavaco Silva,Passos Coelho, o Patriarca de Lisboa,Manuela Ferreira Leite, o Bispo de Aveiro ,Nuno Júdice,etc.Ambas as iniciativas provocaram vários comentários e artigos na comunicação social, com destaque para a Festa do Avante.

Para além da opinião que se possa ter sobre a realização da Festa em tempo de pandemia, a iniciativa permitiu um forte ataque político ao PCP vindo em geral da direita, e,em particular dos sectores mas conservadores desta.Pode ter criado , de facto,em alguns sectores da população a percepção de que os comunistas não abdicam das suas iniciativas mesmo que possam ter um risco elevado para eles e para os outros.E também insistindo em que o governo de Costa foi neste caso facilitador a até cúmplice desta iniciativa.O artigo de Paulo Rangel, alto dirigente do PSD, no Público de 1 de setembro, é ilustrativo desta ataque.

Por outro lado o manifesto agora divulgado em defesa das liberdades na educação vem mostrar que uma  parte da direita portuguesa tem hoje comportamentos semelhantes à seita religiosa «mormon» dos Estados Unidos, ou «talibans do Afeganistão» e querem educar os seus rebentos nas suas crenças, sem pecado, isolados da restante sociedade e não partilhando o que eles consideram uma «cultura marxizante» que, segundo eles, domina a sociedade portuguesa e ocidental.

Os signatários do referido abaixo-assinado, com figuras de proa da direita conservadora e da extrema direita pretende apelar aos pais que utiizem a objecção de consciência, prevista na nossa constituição, para boicotarem a disciplina escolar de Cidadania e Desenvolvimento porque esta cadeira contém conteúdos como trabalho e economia, direitos humanos,igualdade de género (ui), sexualidade e outras matérias sobre as quais todos os cidadãos devem ter informação básica.

Ora, nós vivemos numa República laica e constituida por cidadãos com direitos iguais e oportunidades.A escola, pública ou privada, forma pessoas para poderem exercer uma profissão em dignidade e cidadãos com direitos e deveres.Não podemos abdicar de uma cadeira que transmite conhecimentos básicos sobre setas questões.Podemos debater e até discordar dos conteúdos ou de alguns conteúdos dessa cadeira.Podemos em casa falar de outros assuntos e até de outras propostas com os nossos filhos,mas não podemos objectar uma cadeira de cidadania.

Em Portugal qualquer aluno, português ou imigrante,cigano, preto, indiano, branco ou betinho deve fazer a cadeira de Cidadania e Desenvolivimento.

Direita conservadora quer marcar a agenda política

Mas, o mais importante é saber que a direita conservadora está a trabalhar para marcar a agenda política e ideológica.É nos jornais e televisões que melhor se nota esta estratégia de combate ao que eles consideram uma ideologia progressita de «igualitarismo,de género,do politicamente correcto, de dissolução dos valores tradicionais como autoridade e pátria.Um combate que junta a velha extrema direita com os sectores mais modernos e conservadores da direita empresarial e intelectual e que, a prazo, têm como  objectivo o assalto ao poder.

Infelizmente uma parte da esquerda consola-se com a governação e tira daí proveitos.Uma outra parte vive entrincheirada num forte e considera-se vítima de um ataque político e ideológico.Uma terceira parte vive ao deus dará, sem rumo e sem norte.

Ora , a melhor defesa é o ataque.É tempo de se colocarem outros temas na praça pública como o rendimento básico e universal, o aumento do salário mínimo nacional, o estabelecimento de critérios para um salário mínimo europeu, o reforço do poder  sindical e participação nos lucros dos trabalhadores nas empresas, o teletrabalho devidamente regulado e compensado,os apoios á digitalização e formação dos trabalhadores, o direito de todos a um médico de família, a saúde no trabalho, a melhoria da proteção dos desempregados, a situação nos lares de idosos.Será que a esquerda, nomeadamente o governo minoritário do PS, ficou sem ideias para além das eleições indirectas para as regiões, o orçamento do estado, os fundos europeus?

Finalmente uma palavra para lamentar que altos dirigentes da Igreja Católica em Portugal assinem um papel com este objectivo.Ou não viram bem o problema ou foram enganados.Este manifesto não vem na linha do Vaticano II, nem do Papa Francisco.Está na linha dos católicos que se opuseram à República e ainda não convivem bem com a escola pública, e com o direito universal á educação, um direito fundamental dos direitos humanos.

Mais grave ainda é que estes dignatários da Igreja Católica vão no carro político dos sectores mais conservadores da sociedade portuguesa.Não digam, porém,  que tal manifesto, com tal companhia, não é uma posição política!