sábado, 24 de janeiro de 2015

STRESSE E GESTÃO!

Enquanto se fazem palestras, seminários e campanhas sobre o stresse laboral não falta gente a colocar como critério de recrutamento de trabalhadores a capacidade de resistir ao mesmo, do viver com doses consideráveis de stresse como um valor. Encontramos inclusive em alguns sistemas de avaliação do desempenho o item, considerado favorável, de resistir ao stresse.
 É óbvio que são os gestores ou os consultores de recursos humanos que fazem estes instrumentos de recrutamento e de avaliação. Eles consideram uma qualidade interessante a capacidade de trabalhar em contexto de stresse, ou seja, a de trabalhar numa situação de permanente superação de obstáculos e de enfrentar solicitações desproporcionadas face aos meios ao seu dispor, enfim, de alcançar inclusive objetivos que se revelam pouco realistas. Temos casos muito concretos nomeadamente na saúde onde retiram meios humanos, logísticos e técnicos e exigem simultaneamente mais rendimento aos trabalhadores, mais carga horária, mais procedimentos burocráticos. 
A chamada gestão empresarial dos hospitais exige a «racionalização», a redução de custos permanente. Consequências? Aumento do stresse e da fadiga no pessoal médico e de enfermagem, a falta de camas, aparelhos clínicos, a concentração de meios cirúrgicos e naturalmente o erro, a asneira, a falta de tempo para atender todos os doentes de forma conveniente! E o próprio trabalhador? Como se sente? A imprensa vai dando conta. 
Os técnicos do INEM, os enfermeiros e médicos dos hospitais que se sentem em «bournout», queimados, desgastados! Mas, o mais chocante é que na prática se mandem às ortigas todas as recomendações e medidas de prevenir o stresse, ou gerir o stresse como alguns gostam mais de dizer! Queremos «salvar» o Serviço Nacional de Saúde destruindo física e mentalmente os seus trabalhadores? Queremos maior produtividade sem condições de trabalho? Não é possível, ou seja, poderá ser possível num tempo muito curto até á falência humana. 
O que vemos é que ao discurso da melhoria das condições de trabalho sucede na prática em vários setores o retrocesso da qualidade do trabalho, nomeadamente o aumento das horas de trabalho, o esmagamento dos preços nas subcontratações, estagnação de salários, a precariedade, o assédio e a ausência de condições de segurança e saúde no trabalho. Na base desta realidade está uma filosofia de gestão que apenas pensa no aumento dos lucros dos acionistas e dos generosos salários dos gestores! É a tal «economia que mata» segundo uma expressão feliz do Papa Francisco.

quinta-feira, 22 de janeiro de 2015

REQUALIFICAÇÃO NA SEGURANÇA SOCIAL-processo miserável!

O processo tortuoso de requalificação de trabalhadores na Segurança Social é o caso exemplar da maneira como nos dias de hoje se gere o Estado. Processo conduzido de forma trapalhona pelos dirigentes daquele Instituto, eivado da ideologia privatizadora e conservadora que anima o Ministério de Mota Soares.
 É um caso que se pretende exemplar no sentido de meter medo aos trabalhadores da Função Pública para que estes, com medo do desemprego, estejam calados, aceitem as diretivas do governo e não façam greve! Se o processo não visa a redução de pessoal através do despedimento porque não foram discretos e funcionais nas formas de gestão? Porque não colocar os funcionários onde são precisos sem lhes cortar os salários e sem os mandar para uma espécie de limbo antes de caminharem para o inferno? 
Este processo é o primeiro de outros, dizem os responsáveis políticos! Logo neste processo todos os trabalhadores deveriam lutar sem tréguas contra esta tentativa de despedimento! Mas, infelizmente a reação da maioria dos trabalhadores foi ausente, a de quem espera que lhe queimem as barbas antes de agir. Os sindicatos do setor acompanham e fazem o que podem, mas não existe uma força das bases a condenar este miserável processo! Se vamos pagar por isto? Claro que vamos, e muito!Basta ver as recentes declarações da Ministra das Finanças sobre redução de pessoal no Estado!!

segunda-feira, 19 de janeiro de 2015

A GRANDE OPERAÇÃO!

Nos últimos tempos, em particular com o aproximar do ato eleitoral na Grécia, ocorrem «oportunas»
declarações de dirigentes da direita europeia, da Comissão Europeia e de outros centros de poder político, financeiro e económico no sentido de avisar, leia-se amedrontar, que devem continuar os mesmos a governar aquele país, ou seja os defensores da austeridade e da penalização social e económica dos pobres e trabalhadores! 
De repente, e neste contexto, aparecem os atentados em Paris e Bruxelas atribuídos a radicais muçulmanos em que um dos alvos principais foi um célebre jornal humorístico francês. Parece até que o cérebro do atentado teria fugido para a Grécia! Olha que fuga tão oportuna!
 O sentimento expandido pelos «media» e comentadores de serviço é que estamos numa guerra em plena Europa que vai virar as comunidades muçulmanas contra os europeus cristãos e laicos. Os setores militaristas e securitários bem colocados no aparelho dos Estados, bem como a extrema – direita, não perdem tempo e pedem mão dura, medidas extraordinárias, vigilância dos cidadãos e das fronteiras.Com isto matam de uma cajadada dois coelhos: reforçam o seu poder nos aparelhos e assustam os europeus que perante um mundo caótico pedem mais segurança e menos liberdade, ficando menos predispostos para mudanças eleitorais à esquerda. 
De facto, estamos perante uma grande operação política na Europa! Não digo uma conspiração porque é algo mais complexo. São várias dinâmicas, que podem inclusive ser autónomas, mas que objetivamente criam os mesmos efeitos: o medo e a necessidade de mais segurança! Que fique claro que não estou aqui a justificar os atentados de Paris! Nada, mas mesmo nada, justifica que se mate alguém, seja por que causa for!

sexta-feira, 16 de janeiro de 2015

FORMAÇÃO PROFISSIONAL MELHORA SAÚDE MENTAL DOS TRABALHADORES!

Investigadores sociais portugueses estudaram o impacto positivo da formação profissional na saúde mental dos trabalhadores quer estejam empregados ou desempregados. Joaquim Eurico Valentim Oliveira, José Fernando Cabral Pinto e Rita Barros da Unidade de Investigação em Educação e Tecnologias Educativas do Piaget de Vila Nova de Gaia apresentam este estudo num artigo do nº 129 Revista Brasileira de Saúde Ocupacional, tendo como base uma tese de doutoramento sobre o mesmo tema apresentada na Universidade de Santiago de Compostela.
 Os investigadores inquiriram 210 trabalhadores residentes em contexto suburbano no norte de Portugal. Nos resultados os autores afirmam «verificamos que a - auto percepção de saúde mental por parte dos trabalhadores é mais favorável após a frequência e conclusão de curso de formação profissional, quer na situação em que os sujeitos se encontrem empregados que se encontrem desempregados…» A formação profissional reforça a confiança dos trabalhadores num contexto de incertezas e de complexidade.

quinta-feira, 15 de janeiro de 2015

CONDIÇÕES DE TRABALHO NO INEM! QUE É ISTO?

Um estudo interno realizado em 2013 por uma psicóloga do INEM, em colaboração com a comissão de trabalhadores, indicava que 75% dos técnicos de ambulâncias estava em burnout (35% em burnout alto e 40% em burnout médio) - um distúrbio de carácter depressivo ligado à vida profissional. "Na prática, é estar num ponto limite, em que ou se cai em depressão, ou o trabalhador acaba por se despedir", explica ao i o presidente do Sindicato dos Técnicos de Ambulância de Emergência, Ricardo Rocha. 
Nos últimos anos, conta o responsável, o INEM tem assistido a um crescente número de suicídios entre trabalhadores, assim como despedimentos e baixas psiquiátricas. "Os trabalhadores não são suficientes e acabam por ter condições de trabalho inimagináveis", garante.
Por cada turno extra de oito horas, o trabalhador do INEM recebe 22,50 euros, mas ao exceder os seis turnos extra por mês, deixa de receber esse valor porque esse já excede em 60% o seu salário. Apesar de fazer questão de apresentar estes números, o presidente do sindicato esclarece que as reivindicações salariais não são uma prioridade. "Queremos apenas que respeitem os trabalhadores, dando melhores condições de trabalho, o que passa pela contratação de mais colegas", refere. O INEM está a aguardar a decisão da tutela relativamente à abertura de concurso externo para a contratação sem termo de 110 novos Técnicos de Emergência, mas o presidente do sindicato garante que esse número é insuficiente. "Com a quantidade de pessoas que se despediu ou que entrou em baixa, são precisos, pelo menos, mais 250 trabalhadores", salienta.
Vítor Bezerra, responsável pela Comissão de Trabalhadores do INEM, lembra que para a realização do estudo sobre o burnout, os mais de 400 técnicos de ambulância tiveram que anotar o seu dia-a-dia profissional, referindo os pontos positivos e negativos. Além disso, foram entrevistados repetidas vezes pela equipa de psicologia do INEM. "Os resultados espantaram toda a gente", lembra, acrescentando que "em qualquer outra situação, esta seria uma empresa em risco de fechar". Depois dos resultados terem sido divulgados internamente, a antiga direcção organizou sessões entre os trabalhadores e a equipa de psicologia do INEM e foram criados sessões de grupo, "ao estilo alcoólicos anónimos", refere Vítor Bezerra, onde os trabalhadores podiam partilhar o seu dia-a-dia profissional. "Tudo isso acabou com a entrada do novo presidente", garante.
A comissão de trabalhadores explicou ao i que já tentou, sem sucesso, junto da direcção que o trabalho seja agora alargado para os trabalhadores que atendem e tratam as chamadas de emergência, acreditando que, neste caso, o número seria ainda maior. Há alguns meses que o INEM se debate com um atraso no tempo de atendimento de chamadas que, segundo alguns técnicos contactados pelo i, já terão levado à morte de pacientes. No dia 2 de Janeiro, por exemplo, o tempo médio de atendimento de uma chamada rondava os dois minutos, quando o tempo padronizado pelo INEM é de 7 segundos.
 Sobre essa altura do mês em específico, o INEM justifica o atraso com o mais elevado número de chamadas feitas. Fonte oficial admite que o tempo de atendimento "está na casa dos segundos", podendo ter-se verificado um ligeiro aumento de segundos relacionados com o acréscimo do número de chamadas para as centrais do INEM, mas que não se reflecte nos tempos globais de resposta às emergências.(Jornal I de 12 de janeiro de 2015).

terça-feira, 13 de janeiro de 2015

RISCOS NO TRABALHO COM MÁQUINAS: Campanha inédita em Portugal!

A Autoridade para as Condições do Trabalho (ACT) em parceria com os Parceiros Sociais, Institucionais e Técnicos, promove, no dia 23 de janeiro, no ISCTE, em Lisboa, a Sessão de Lançamento da Campanha de Prevenção de Riscos Profissionais em Máquinas e Equipamentos de Trabalho, esperando-se cerca de meio milhar de participantes vindos de todo o país, representantes da Comissão Europeia e da Inspeção do Trabalho e Segurança Social de Espanha onde também se irá realizar uma campanha idêntica. No ano de 2013 apurou-se que foram objeto de inquérito pela ACT 141 acidentes de trabalho mortais, em toda a atividade económica, sendo particularmente relevantes os ocorridos na construção, na indústria transformadora e na agricultura. Relativamente aos acidentes de trabalho ocorridos com a utilização de máquinas e de equipamentos de trabalho concluiu-se que, nesse ano, foram objeto de inquérito 57 acidentes de trabalho mortais, representando cerca de 40% do total dos acidentes mortais. Esta realidade, constatada pela ACT em Portugal e por entidades congéneres noutros países europeus como a vizinha Espanha, é a principal razão desta iniciativa inédita à qual aderiram associações sindicais e empresariais, bem como entidades de algum modo relacionadas com a produção, comercialização e normalização de máquinas e equipamentos de trabalho. As ações a desenvolver pela Campanha serão diversificadas, com um enfoque particular na informação, sensibilização, formação e inspeção, decorrendo em todo o território continental durante o ano de 2015. Na Abertura da Sessão de Lançamento estão previstas intervenções do Inspetor-Geral da ACT, Pedro Pimenta Braz, de Maria Teresa Moitinho de Almeida, Chefe de Unidade da DG EMPL da Comissão Europeia, de Rafael Martin Mesas, Subdiretor-Geral da Inspeção do Trabalho e Segurança Social de Espanha e do Reitor do ISCTE, Luís Reto. No decorrer da sessão estão ainda agendadas numerosas intervenções de natureza técnica e de Parceiros Sociais e Institucionais, nomeadamente, da CGTP, da UGT, da AECOPS, do CICCOPN, do CATIM, do CENFIC da ASAE e do ISQ. O encerramento está previsto para as 16H15 horas, sendo antecedido pela assinatura do Protocolo da Campanha que, de algum modo, assinala o compromisso de todos os parceiros nesta iniciativa de informação, sensibilização, formação e inspeção visando a redução da sinistralidade laboral.

SAÚDE NO TRABALHO EM 2015

O novo ano de 2015 terá que resolver algumas velhas heranças no domínio das condições de trabalho deixadas sem explicações pelo ano de 2014.Aponto apenas duas que são um verdadeiro exemplo de como funcionam as instituições em Portugal, ou seja, como funcionamos enquanto pessoas e povo.
 Trata-se do inquérito nacional às condições de trabalho, previsto na estratégia nacional para a segurança e saúde no trabalho 2008-2012, sendo logo a medida 1 do primeiro objetivo deste documento aprovado pela Resolução 59/2008 do Conselho de Ministros. A outra é a mais que badalada questão do amianto nos edifícios públicos. Sobre estas duas questões espero que a nova Estratégia Nacional 2015-2020 diga algo de substancial para além de meras generalidades e boas intenções.Com efeito, não se compreende que em Portugal nunca se tenha realizado um verdadeiro inquérito às condições de trabalho dos portugueses para conhecermos de forma mais científica a realidade e podermos gizar políticas de promoção da segurança e saúde com maior eficácia.
O que se passou até agora sobre esta questão é verdadeiramente significativa de como funciona o Estado em Portugal. Temos grupos de trabalho que se eternizam e não apresentam conclusões, decisões que se protelam, falta de vontade em investir nestas matérias. Mas o problema não respeita apenas ao Estado. Alguns parceiros sociais também não consideram esta questão prioritária.
Quanto á existência do amianto nos edifícios públicos há que reconhecer que não é uma questão de fácil resolução. Mas esta é mais uma razão para se agarrar na mesma com unhas e dentes pois está em causa a vida de pessoas! O comportamento do governo nesta matéria foi oportunista e revela um desprezo soberano pela vida dos portugueses, quer sejam os funcionários quer os cidadãos utentes!
O governo constituiu um grupo de trabalho de alto nível para enfrentar esta questão. Todavia, até agora apenas fez uma listagem dos edifícios que terão, porventura, materiais de amianto. Não organizou equipas técnicas para avaliar os riscos dos edifícios e tomar medidas. Entretanto, alguns porta-vozes, mais avalizados sob ponto de vista técnico, vieram a público gritar contra o alarmismo promovido pela comunicação social! Claro que foi o que o governo quis ouvir. Pois, afinal os riscos não serão assim tão grandes pensaram os governantes. Caiu assim o silêncio sobre uma questão muito grave para a saúde dos portugueses!

sexta-feira, 9 de janeiro de 2015

STRESSE E LINGUAGEM!

«Os riscos psicossociais e o stresse relacionado com o trabalho geram custos significativos para as organizações e as economias nacionais. Os trabalhadores são suscetíveis de ficar afastados do trabalho por períodos consideráveis quando sofrem de stresse relacionado com o trabalho ou de outros problemas psicológicos. Sempre que sofrem de stresse relacionado ao trabalho, os trabalhadores tendem igualmente a apresentar-se ao trabalho mesmo quando não se encontram em situação de poder desempenhar cabalmente as suas funções (o chamado «presenteísmo»).
 Esta circunstância conduz a uma redução da produtividade e, consequentemente, a uma redução da rentabilidade da empresa. Na Europa como um todo, estima-se que os custos totais com perturbações da saúde mental (relacionadas ou não com o trabalho) ascendam a 240 mil milhões de euros por ano. Menos de metade desse montante resulta de custos diretos, como tratamentos médicos, sendo 136 mil milhões de euros imputáveis à perda de produtividade, incluindo o absentismo por baixa médica…»
Este é um pedaço de um texto sobre o stresse no portal da Agência Europeia para a Segurança e Saúde no Trabalho. Claramente a questão do stresse é vista sob ponto de vista economicista como uma peste que pode afetar a produtividade da empresa e reduzir os seus ganhos. Em geral o discurso das instituições europeias e até nacionais é o «economês», ou seja, a prevenção dos riscos é abordada sob o ponto de vista das vantagens da empresa, enfim para sensibilizar os patrões. Falta quase sempre o discurso do ponto de vista do trabalhador, nomeadamente do contexto da organização de uma economia e de uma organização do trabalho que trata o trabalhador como «mão-de-obra». É a crença de que os patrões se vão sensibilizar com essa abordagem…alguns, muito poucos, talvez! As mudanças fundamentais terão que ser levadas a cabo pelos que sofrem na pele os problemas!

terça-feira, 6 de janeiro de 2015

DIGNIDADE DO TRABALHO!

Um psicólogo fingiu ser varredor durante 1 mês e viveu como um ser invisível. O psicólogo social FB da Costa vestiu a farda de varredor durante 1 mês e varreu as ruas da Universidade de São Paulo, onde é professor e investigador, para concluir a sua tese de mestrado sobre 'invisibilidade pública'.
Ele procurou mostrar com a sua investigação a existência da 'invisibilidade pública', ou seja, uma percepção humana totalmente condicionada pela divisão social do trabalho, onde se valoriza somente a função social e não a pessoa em si. Quem não está bem posicionado sob esse critério, torna-se uma mera sombra social. Constatou que, aos olhos da sociedade, os trabalhadores braçais são 'seres invisíveis, sem nome'. ... Ele trabalhava apenas meio dia como varredor, não recebia o salário de R$ 400 como os colegas, mas garante que teve a maior lição de sua vida:
“Descobri que um simples BOM DIA, que nunca recebi como varredor, pode significar um sopro de vida, um sinal da própria existência”, explica o investigador. Diz que sentiu na pele o que é ser tratado como um objeto e não como um ser humano. “Os meus colegas professores que me abraçavam diariamente nos corredores da Universidade passavam por mim e não me reconheciam por causa da farda que eu usava.” - O que sentiu, trabalhando como varredor? Uma profunda angústia. Uma vez, um dos varredores convidou-me para almoçar no refeitório central. Entrei no Instituto de Psicologia para levantar dinheiro, passei pelo piso térreo, subi as escadas, percorri todo o segundo andar, passei pela biblioteca e pelo centro académico, onde estava muita gente conhecida. Fiz todo esse percurso e ninguém EM ABSOLUTO ME RECONHECEU. Fui inundado de uma indescritível tristeza. -
 E depois de um mês a trabalhar como varredor? Isso mudou? Fui-me habituando a ser ignorado. Quando via um colega professor a aproximar-se de mim, eu até parava de varrer, na esperança de ser reconhecido, mas nem um sequer olhou para mim. - E quando voltou para casa, para o seu mundo real, o que mudou? Mudei substancialmente a minha forma de pensar. A partir do momento em que se experimenta essa condição social, não se esquece nunca mais. Esta experiência mudou a minha vida, curou a minha doença burguesa, transformou a minha mente. A partir desse dia, nunca mais deixei de cumprimentar um trabalhador. Faço questão de o trabalhador saber que eu sei que ele existe, que é importante, que tem valor. Aprendi verdadeiramente, com esta experiência, o valor da dignidade.

domingo, 4 de janeiro de 2015

TROIKA TIROU AO TRABALHO PARA DAR AO CAPITAL!

O período do programa de ajustamento da troika. e do governo é marcado por uma transferência de grandes proporções dos rendimentos do trabalho para os do capital, indicam dados do Instituto Nacional de Estatística (INE) publicados esta semana.
As famílias portuguesas estão mais capitalistas, por assim dizer. De acordo com cálculos do Dinheiro Vivo à forma como evoluiu a distribuição do rendimento das famílias entre o segundo trimestre de 2011 e o terceiro trimestre deste ano (valores trimestrais, médias móveis de quatro meses), verifica-se uma quebra brutal do rendimento dos salários (menos 5,8 mil milhões de euros, ou uma redução de 6,9%). Foi a única parcela do rendimento disponível bruto que caiu.
O emagrecimento das remunerações pagas deve-se à compressão, aos cortes diretos nos salários e ao efeito da subida do desemprego. Ao mesmo tempo, as duas componentes relativas à remuneração do capital registaram aumentos assinaláveis durante os 14 trimestres do programa: os rendimentos de propriedade - são, grosso modo, rendas de imobiliário, juros auferidos, ganhos em dividendos - engordaram 3,5 mil milhões de euros (mais de 36%) e o excedente de exploração (que reflete a remuneração do fator capital em sentido estrito, o valor acrescentado) somou mais 860 milhões de euros (mais 2,8%). Ou seja, mesmo com crise, recessão e um programa de ajustamento muito duro que deprimiu a economia e sobrecarregou as famílias com enormes aumentos de impostos, a parte relativa ao capital resistiu mais do que bem: aumentou 4,4 mil milhões de euros entre o momento em que a troika entrou no país e o terceiro trimestre deste ano.
Os impostos sobre rendimento e património, que abatem ao rendimento disponível das famílias, foram, como já se esperava, os campeões do crescimento nestes três anos e meio de austeridade: no terceiro trimestre, o aumento registado foi superior a 46%. Mais 4,6 mil milhões de euros cobrados pelo Estado, em termos absolutos. Visto de outra perspetiva, o que está a acontecer é uma alteração estruturar da distribuição de rendimentos.
Os rendimentos do trabalho perderam importância, baixando de 65,5% do rendimento disponível bruto das famílias portuguesas para 62,4%. Em sentido contrário, os rendimentos do capital reforçaram de 32,1% para 36,4% do total. Há seis meses, o Dinheiro Vivo fez esta mesma análise, mas em termos anuais e para o período que marcou a, crise financeira e económica (2007 a 2013). Os resultados são similares. Na altura, concluiu-se que no início da crise de 2007-2008 e o final de 2013 assistiu-se, em Portugal, a uma transferência de riqueza do trabalho para o capital de grandes proporções, dizem vários economistas. Pedro Ramos, professor catedrático da Universidade de Coimbra e antigo diretor do departamento de contas nacionais do INE, fez os cálculos e apurou que o peso do trabalho por conta de outrem e por conta própria desceu de 53,2% do produto interno bruto em 2007 para 52,2% em 2013, por exemplo.
Para este especialista, a crise, e em especial o programa de ajustamento da troika, permitiu extrair valor ao fator trabalho ao mesmo tempo que enriqueceu o capital. É um fenómeno "estranho", um "fenómeno novo", referiu. "Sabemos que nas crises económicas as empresas têm prejuízos, as crises atingem os ationistas. Existe portanto perda de valor ao nível dos excedentes de exploração", observou o académico. Não foi o que aconteceu. A análise aos dados trimestrais dá uma noção ainda mais atualizada e dramática do processo em curso.
A parte positiva desta alteração estrutural terá mais que ver com o reforço da capacidade de poupança que, expetavelmente, pode ajudar o investimento. Se houver mais capacidade capitalista, significa que, a prazo, pode haver mais novo investimento e criação de emprego. Não é o que está acontecer do lado das famílias. "A taxa de poupança das famílias diminuiu, fixando-se em 9,7% (10,3% no ano terminado no trimestre anterior), devido sobretudo ao aumento da despesa de consumo final (variação de 0,7%)", explicou o INE.(Diário de Notícias de 27 de dezembro de 2014)

sexta-feira, 2 de janeiro de 2015

SEGURANÇA E SAÚDE DOS TRABALHADORES. problemas que se agravam!

A crise que assola a Europa e em particular Portugal veio acelerar alguns problemas no domínio da promoção da segurança e saúde dos trabalhadores. 
 Coloco apenas três em evidência porque não posso ser obviamente exaustivo: a degradação das condições de trabalho com provável aumento da sinistralidade e doenças profissionais; a incapacidade dos serviços de segurança e saúde em protegerem todos os trabalhadores com eficácia e a perda de competências e de meios das inspeções do trabalho. Na base destes problemas está a falta de investimento na saúde dos trabalhadores como consequência da desvalorização do trabalho numa economia gerida por uma ideologia gestionária que coloca acima de tudo a redução de custos, a competitividade e a remuneração dos acionistas e gestores.
 Efetivamente por toda a Europa se constata uma relativa degradação das condições e relações de trabalho como exigência para fazer face á concorrência entre empresas, entre países e entre continentes. Os sinais mais evidentes são nos países da Europa de Leste e nos países do sul e em particular nos intervencionados pela Troika como Portugal. Esta situação conduz a que as empresas optem por contratar serviços de saúde a custos mínimos em que não estão garantidos os serviços médicos necessários a uma boa prevenção das doenças e acompanhamento da saúde dos trabalhadores. O caso português é paradigmático. Todos sabemos que na maioria das empresas não existe um efetivo serviço de segurança e saúde no trabalho. Existem contratos baratos para cumprirem formalmente a lei. Todos sabemos que os serviços de saúde não atendem as microempresas e os trabalhadores independentes nem estão preparados para tal serviço! A esmagadora maioria dos trabalhadores portugueses não tem efetiva saúde ocupacional.
Mas a consciência dos próprios trabalhadores neste domínio é reduzida e estão naturalmente preocupados com a manutenção do seu próprio emprego! Em simultâneo ocorre em quase todos os países europeus a degradação dos serviços inspetivos do trabalho. Os orçamentos das inspeções do trabalho são cortados e os quadros de pessoal diminuídos. Por vezes, também são reduzidas as competências dos organismos inspetivos como aconteceu recentemente com a ACT que viu retirada a sua competência de intervir nos serviços do Estado e autarquias! Alguns destes problemas já se tinham detetado há anos. Todavia, com a crise do capitalismo financeiro os governos conservadores e ultra liberais e a Comissão Barrosos aproveitaram para aplicar medidas de sobre exploração laboral, medidas que o patronato europeu e mundial já reivindicava há muito tempo.
Agora temos um conjunto de problemas que se agravaram e que não são de fácil resolução. Os próximos dez anos serão decisivos.Com vão ser as inspeções de trabalho? Que serviços de saúde no trabalho? Que sistemas de prevenção e promoção da segurança e saúde dos trabalhadores? Lamentavelmente não existe nenhum organismo ou grupo de trabalho na sociedade portuguesa que pense estas coisas a longo prazo, (Think Tank) que pense para além do ativismo diário. Iremos como sempre atrás da fatura!