quarta-feira, 25 de setembro de 2019

OS TRABALHADORES E OS ACIDENTES DE TRABALHO

Recentemente vi um dirigente de um grande sindicato europeu afirmar que uma grande parte dos acidentes de trabalho na sua região são por culpa dos trabalhadores.Esta afirmação ainda se ouve demasiadas vezes não apenas por patrões mas até por sindicalistas como é o caso.
Ora ,sabemos que os acidentes e incidentes são sintomas de que existem disfunções nas empresas ou serviços.Os estudos efectuados revelam que as causas dos acidentes são múltiplas e nunca se pode dizer que foi apenas uma causa.Raros são os casos em que existe uma clara negligência ou má fé do trabalhador.Mesmo o caso de negligência ou de abuso de álcool ou droga revelam falta de uma ação preventiva, nomeadamente de controlo e formação dos trabalhadores.
Por outro lado, sabemos que em prevenção de riscos profissionais não podemos falar de «culpa» no sentido religiosos ou moral.Podemos falar de responsabilidade.A primeira responsabilidade é da empresa e da sua gestão.Legalmente as empresas são obrigadas a criar as condições de segurança no trabalho e a promover a saúde dos trabalhadores.É uma responsabilidade patronal.A lei também diz quais são as obrigações dos trabalhadores que devem zelar pela  sua segurança e pela segurança dos companheiros, proteger-se sempre que necessário,avisar a hierarquia e serviço de segurança quando existe perigo iminente,obedecer às recomendações e directivas de segurança e comparecer aos exames médicos, participar nos órgão de prevenção.
Valorizar a «culpabilidade» do trabalhador nos acidentes de trabalho não é científico e é abrir caminho ao revisionismo da legislação social e do direito do trabalho como está a fazer o Brasil de Bolsonaro.
A extrema direita em vários países visa destruir o direito do trabalho e acabar com o tratamento mais favorável do trabalhador equiparando este ao empregador como se fossem partes em pé de igualdade nas relações de trabalho.Para eles a vítima é o empresário e o carrasco é o trabalhador que, segundo eles, está demasiado protegido!É virar o bico ao prego para dar mais lucros ao capital a quem, efectivamente servem.

segunda-feira, 9 de setembro de 2019

CONTRIBUTO PARA UMA AVALIAÇÃO DAS LUTAS LABORAIS NA LEGISLATURA


Os recentes conflitos laborais que  envolveram os enfermeiros portugueses,os motoristas de matérias perigosas e os tripulantes de cabina da Ryanair foram motivo de diversas opiniões, tomadas de posição e reflexões colocando a questão sindical na actualidade e motivo para alguns debates.
Entre as muitas questões que se podem debater saliento uma que poderia formular da seguinte maneira:o sindicalismo das duas maiores confederações sindicais portuguesas tem sido um sindicalismo conformista, servindo apenas para canalizar o descontentamento de algumas franjas de trabalhadores mais radicalizados sem grande eficácia na melhoria das relações de trabalho e na qualidade de vida e de trabalho dos trabalhadores portugueses?
E uma segunda questão:será que estamos numa fase em que alguns sectores profissionais procuram lutar fora do chapéu sindical das grandes confederações almejando, ilusoriamente ou não, melhores resultados para as suas lutas?
Antes mais será bom começar pelo quadro político em que se desenvolveram as mais recentes lutas sindicais nos quatro anos da  legislatura de governo PS com apoio da restante esquerda.Para além dos conflitos  que citei acima temos os da Autoeuropa e a dos estivadores ambas com a compreensão da UGT e CGTP mas bastante autónomas quanto a estas organizações confederais.
Durante estes quatro anos, embora de modo diverso, tanto a UGT como a CGTP apoiaram estrategicamente o governo PS procurando conseguir o máximo de reivindicações .Pouco mais conseguiram  para além do que estava escrito nos acordos com o PEV,BE E PCP.A CGTP com um apoio mais crítico e mais activa nas ruas.A UGT com algum criticismo até à assinatura do acordo sobre a precariedade que deu origem à décima quinta  alteração ao Código do Trabalho.Todos podemos  constatar que os grandes conflitos nesta legislatura não tiveram origem nem na UGT nem na CGTP.Por vezes, ambas as centrais sindicais tiveram que agarrrar o carro da luta já em andamento como no caso dos enfermeiros.

Avaliação dos quatro anos de lutas

Não faltaram opiniões de vários quadrantes qualificando estes conflitos, em especial as greves dos motoristas de matérias perigosas como ações perigosas de sindicalismo radical.Mas também não podemos esquecer que há quem critique o sindicalismo da UGT e da CGTP de demasiado conformista e burocrático.Um sindicalismo demasiado comprometido com os partidos políticos.
Claro que nestas análises tanto podemos ver o copo meio cheio como meio vazio.Mais tarde ou mais cedo convirá fazer uma avaliação destes quatro anos de lutas no que respeita à valorização salarial e de qualidade de trabalho.Podemos, no entanto, avançar já com algumas ideias e interrogações.
Assim, em primeiro lugar constatamos que de algum modo a valorização salarial foi pequena no sector privado  não chegando à maioria da administração pública, que não tem aumentos há dez anos.Mesmo os aumentos do salário mínimo não significaram uma ruptura com o paradigma de baixos salários que persiste em Portugal e de estagnação salarial na Europa.
A precariedade aumenta, em particular nos contratos com jovens trabalhadores e desempregados de longa duração e o processo de integração dos precários na Função Pública está embrulhado sem sabermos se ficará ainda bloqueado.

Erosão dos direitos dos trabalhadores

.A erosão dos direitos dos trabalhadores, nomeadamente os direitos á segurança e saúde, horários que conciliem a vida familiar e profissional e o comabte ao assédio moral é evidente e preocupante.Temos sinais diários de espezinhamento da legislação laboral, de trabalho clandestino e de de exploração  evidenciada na contínua diminuição da parte distribuída ao trabalho na riqueza criada em Portugal.Aliás Portugal foi dos países onde menor foi a parte da riqueza distribuida ao trabalho face ao capital.Por outro lado o acordo assinado entre os patrões, o governo e a UGT não dá garantias, antes pelo contrário, de que trave efectivamente a precariedade.Antes de mais porque o acordo assenta na filosofia da flexisegurança da Comissão Europeia em que os contratos a prazo são necessários, embora se deva evitar os  abusos dos mesmos.
Podemos assim concluir que as lutas sindicais embora aumentassem de forma acentuada a partir de 2017  ficaram aquem das reivindicações inicais, incluindo as mais radicais como o dos enfermeiros e dos motoristas.Basta ver os dados estatisticos das greves  declaradas e os ganhos alcançados e ainda a confiança que diminui nos sindicatos.Urge repensar a ação sindical e avaliar estes quatro anos.Existe a possibilidade de outros sectores se radicalizarem na busca de melhores resultados salariais e de carreira.As organizações dos trabalhadores não existem apenas para impedir o regresso da direita ao poder e apoiar soluções políticas de controlo do deficit e de promoção da competitividade da economia. Os trabalhadores querem mais resultados das lutas travadas ou a travar.Querem naturalmente uma maior justiça e melhor partilha da riqueza que não tem ocorrido no nosso país.Os trabalhadores e suas organizações não podem aceitar limitações ao direito á greve em nome da circulação de mercadorias e pessoas.Como fazer e o que fazer?

quinta-feira, 5 de setembro de 2019

DIÁLOGO SOCIAL E PODER DOS TRABALHADORES


Com a globalização os sindicatos enfraquceram relativamente, em especial a taxa de sindicalização desceu de forma muito acentuada. A flexibilidade apregoada na União Europeia veio beneficiar em especial as empresas,ao flexibilizar os horários de trabalho as carreiras e os vínculos laborais.O trabalho precário está a ser a norma nos novos contratos como acontece no caso português.O quadro político mundial, nomeadamente as grandes instituições como o FMI, Banco Mundial, OCDE e a própria União Europeia favorecem os negócios e querem ainda mais reformas laborais para dar competitividade às empresas retirando valor ao trabalho.
Estamos efectivamente num quadro de crescente fragilidade do Movimento Sindical internacional e nacional.O trabalho muda com grande rapidez enquanto que os sindicatos têm dificuldade de  encontrarem formas organizativas e de ação para enfrentar os novos desafios.A precariedade, as formas de trabalho atípico e a individualização dos contratos de trabalho  são desafios importantes.
No quadro do centenário da OIT a Confederação Sindical Internacional (CSI) lançou uma ofensiva  para sensibilizar as instituições mundiais e regionais para a necessidade de um novo contrato social .Uma ideia que comporta uma renovação do papel da OIT na luta pelo trabalho com direitos em todo o mundo.
Todavia, o quadro mundial e regional,  acionistas  das multinacionais, empresas,  governos e instituições económicas e políticas não é favorável ao compromisso e ao diálogo social .E porquê?Porque a relação de forças é hoje muito mais favorável ao capital do que ao trabalho.O progresso tecnológico trouxe muitas vantagens a todos por certo,mas trouxe em particular vantagens aos negócios,às grandes companhias e plataformas que trabalham pel internet. Em espanha desde 2012 mais que duplicaram os milionários ou seja as pessoas com mais de 30 milhões de euros.
O diálogo social apenas tem viabilidade quando existe algum equilibrio de poderes.Ora, sabemos que neste momento este equilibrio não existe em parte alguma do mundo.Mesmo na Europa, onde o Movimento Operário e Sindical teve e ainda tem algum poder,metade das empresas não tem qualquer representação colectiva dos trabalhadores.Por outro lado os sindicatos têm perdido muitos associados e mostram dificuldade em filiar os mais jovens.
Esta situação foi assim pouco propícia para que se conseguisse construir uma Declaração da OIT mais ambiciosa comemorando  o centenário desta Organização que também ela foi perdendo força e capacidade de tornar o trabalho digno efectivo na maior parte do mundo.
Não se pode , no entanto, perder a esperança nesta luta pela dignidade do trabalho e pela emancipação dos trabalhadores.
Mas por melhores intenções que tenhamos não podemos ignorar que apenas com o reforço do poder dos trabalhadores nos locais de trabalho e nas sociedades pode existir um verdadeiro diálogo social.Sem esse poder,em particular nas empresas, teremos apenas a decisão unilateral dos patrões e acionistas.Teremos apenas uma economia vista pelo prisma do lucro e da competitividade,uma economia que mata, ambientalmente insustentável e que nos torna a todos descartáveis.