segunda-feira, 26 de maio de 2008

AOS OPERÁRIOS QUE MORREM NAS OBRAS EM ESPANHA!

Sentou-se silenciosamente no banco vazio à minha frente colocando uma pequena mala ao seu lado.Oferecei-me para lhe colocar a bagagem no espaço reservado para o efeito mas ela agarrou-se á mala esboçando um sorriso que alegrou um pouco a sua cara triste .Os cabelos com muitas brancas e uns olhos particularmente vivos davam-lhe uma certa beleza, apesar dos anos e de um ar sofrido reflectido nas suas maõs morenas e calejadas pelos trabalhos manuais.O ar simples e humilde e as roupas escuras indiciavam talvez uma camponesa que regressva da cidade, depois de visitar os familiares.
Dei-me conta que depois de se sentar no seu canto olhou para mim com alguma curiosidade ,dando sinais de querer encetar conversa para melhor passar a viagem.A estação de destino que serviu para o início da conversa serviu também para descobrirmos que afinal também tinhamos nascido na mesma aldeia e concelho.Curiosamente até tínahmos sido companheiros de brincadeiras na escola.
Palavra puxa palavra, o coração começa a falar e a contar um rosário de vida que marcaram a história de cada um.
O brilho do olhar dela porém esfumou-se quando lhe perguntei pelo marido.O luto que a acompanhava era pelo homem falecido em Espanha numa obra de auto-estrada.A escassez de trabalho naquela altura empurrou o marido para os lados de Valladolid na busca de melhores oportunidades.Os filhos estavam todos criados mas ainda tinham os netos e as dívidas da casa que ,finalmente puderam comprar com um pouco de terra para uma horta!Terra que os seus pais e avós nunca tiveram naquele Douro tão duro para eles!
Os salários em Espanha eram bem melhores.A vida teria um rumo melhor se não fosse aquele acidente que lhe roubou o marido e companheiro de uma vida de tantos anos.As indemnizações recebidas esfumaram-se em pouco tempo. Os trabalhos que agora lhe aparecem já não são para as suas forças, embora ainda não esteja velha!
Mas , o que mais lhe doeu foi ver o companheiro partir vivo para Espanha e regressar assim frio e dentro de uma urna funerária.Para ela a vida acabou ali.Nunca mais a sua alma abandona o luto.Aquele acidente confirmou infelizmente e ao arrepio dos tempos ,um velho ditado:"De Espanha nem bom vento, nem bom casamento!"
ORTEGA

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