terça-feira, 27 de setembro de 2022

A ECONOMIA DE FRANCISCO E O SINDICALISMO:há pontos em comum?

 

O Papa Francisco continua a agitar as águas do mundo e qualquer


pessoa,crente ou pouco crente,não pode deixar de admirar este homem fragilizado e bastante idoso pela sua enorme energia e lucidez!

É espantoso como tem desencadeado e dinamizado em simultâneo três dinâmicas no mundo católico com um entusiasmo contagiante e ecuménico,são elas:

-O Sínodo da Igreja que abala a estrutura clerical

-A economia de Francisco que envolve alguns sectores de jovens e universitários de todo o mundo e pretende um novo  modelo económico;

-As Jornadas Mundiais da Juventude de Lisboa onde a Igreja Católica pretende afirmar-se como mobilizadora de massas e é a actividade que mais ambiguidade comporta.

A sua atitude obriga-me mais uma vez a falar de assuntos que actualmente acompanho da periferia, porque óbviamente me sinto desafiado.Em todas estas iniciativas Francisco parte de uma abordagem muito própria, ou seja, das periferias , dos marginalizados e sem voz, da necessidade de fazer justiça aos injustiçados e defender a «Mae Terra».As suas referências centrais são bem conhecidas: a figura espantosa de Francisco de Assis que se fez pobre no meio dos pobres, contestando a deriva de poder e dinheiro da própria Igreja  e proclamou o amor a todos os seres da terra, e a parábola do samaritano, aquele que, sendo marginal ao povo eleito, se compadeceu de quem sofria.

O acontecimento mais recente foi o «Encontro de Assis» sobre a Economia de Francisco.Perante um capitalismo predador da terra e dos pobres, fomentador da guerra ,da violência e competição, Francisco procura incentivar um movimento dinamico global de vontades e competências para encontrar saídas para esta« economia que mata».Francisco supera aqui a tradicional «Doutrina Social da Igreja» e é muito mais abrangente, interrogativo e aberto.Aponta as linhas mestras de um outro modelo económico mas não apresenta um modelo concreto como é óbvio.O novo modelo tem que respeitar a terra e os homens e as mulheres do planeta, as riquezas distribuídas, os direitos dos trabalhadores respeitados;os que não têm voz também devem ter voz;teto, terra e trabalho para todos.Embora Francisco nunca o diga um tal modelo é anticapitalista

O  sindicalismo mundial vai ao encontro deste modelo de Francisco?

Entretanto, a Confederação Sindical Internacional CSI, realiza em novembro próximo, o seu Congresso em Melbourne,Austrália.Logo no início do projecto de declaração do congresso podemos ler«Um novo contrato social torna-se mais urgente do que nunca para que a economia esteja ao serviço da humanidade e para salvar as pessoas e o planeta da destruição.Apenas com os trabalhadores organizados se pode conseguir este novo contrato social.Este assenta as bases para a democracia, a igualdade, uma prosperidade compartilhada para enfrentar os desafios que a população de todo o mundo enfrenta».

O projecto de declaração continua dizendo que mais de 2.000 milhões estão na pobreza e no desespero, faz um levantamento das desgraças por que passam milhões de trabalhadores nos seus locais de trabalho, nomeadamente os mais de dois milhões que morrem por causas profissionais,as perdas de emprego e os efeitos da pandemia,etc,etc.Apresenta depois um conjunto de reivindicações e compromissos para o mundo sindical, desde as condições de trabalho , ao emprego e salários.O documento reclama um novo contrato social fundamentado em seis reivindicações dos trabalhadores e trabalhadoras :emprego, direitos,salários, proteção social,igualdade,inclusão.

O documento é, no entanto, quase omisso  na explicação clara das razões destas situações,ou seja,do causador profundo destes males ambientais e sociais-o capitalismo-embra critique num ponto ou outro as políticas neoliberais. Evita as clivagens politicas no seio do movimento sindical onde se encontram correntes mais á esquerda e mas á direita.No entanto,  muitas reivindicações vão ao encontro da« Economia de Francisco», nomeadamente a justiça social, começando por salários dignos,condições de trabalho decentes, o emprego e proteção social para todos, paises ricos e países pobres,a defesa de transição ecológica e digital justas, com respeito pela terra e pelos seres vivos.

Onde está o busilis?

Os sindicatos pretendem um novo contrato social que faça renascer a esperança de milhões de trabalhadores e trabalhadoras,bem como as respectivas famílias.Francisco incentiva o caminho para um novo modelo humanista,cooperativo,ecuménico,ecológico e democrático,dando voz a quem não tem voz.Mas temos um grosso problema que é o seguinte:quer o mundo dos negócios, das multinacionais,dos ricos, um novo contrato social e um novo modelo económico?Será que precisam dele?Aparentemente não precisam e a maioria não quer qualquer contrato e sente-se muito bem acumulando riqueza,alargando o fosso classista, protegendo-se como uma casta com direitos especiais .Claro que os mais lúcidos perceberam que o barco ao afundar-se leva toda a gente, mas primeiro vão os da terceira classe.

Apenas um forte movimento sindical, político e popular a nível mundial, bem articulado, consciente e mobilizado poderá inverter a relação de forças e obrigar os poderosos a novos compromissos.Com a juventude, com velhas e novas organizações.O que vemos não é isto,antes pelo contrário, vemos parte substancial da classe trabalhadora votar na extrema direita como ocorreu na Suécia, na França e na Itália.Vemos o movimento político socialista e social democrata fazer compromissos com o capital na governação.Vemos grande parte  do movimento sindical acomodado e institucionalizado. Vemos pouca crença e motivação militante nas pessoas, mesmo as mais conscientes.Há muito trabalho pela frente!Mas a esperança nunca morre nos corações dos homens e mulheres de boa vontade!

Sem comentários: