Convidado pela Liga Operária Católica/Movimento de
Trabalhadores Cristãos, LOC/MTC, participei a 7/8 de junho, em Leiria, no seu
XIX Congresso Nacional. O evento teve características muito próprias como o
trabalho de grupos e a participação de pessoas de várias Dioceses ligadas ao
terreno social, nomeadamente ao mundo do trabalho.
Os participantes, nacionais ou internacionais, eram em geral
militantes daquele Movimento
Católico ou convidados com algum conhecim ento da
História do mesmo ou ainda colaboradores. Há que assinalar a presença de D.
José Ornelas, Presidente da Conferência Episcopal Portuguesa.
Reflexões breves no pós-Congresso
Várias foram as minhas reflexões, algumas delas partilhadas,
no seguimento deste evento promovido por um Movimento com história, ainda
infelizmente pouco conhecida, e que vai fazer noventa anos em 2026.
A primeira interrogação que tenho há bastante tempo é a
seguinte: como é possível que uma Igreja Católica, que tem uma estrutura tão
poderosa, nomeadamente paroquial, uma rede de contactos e de funcionários tão
vasta e até de meios financeiros, não apoia de forma sustentável e convicta a
Pastoral do mundo do trabalho, podendo ser uma referência relevante neste
aspeto no nosso país?
Como é possível que se deixem os militantes e os seus grupos
trabalhar quase sem rede financeira, alguns até, na sua pobreza, a pagar do seu
bolso a maioria das atividades ou, em alguns casos, a angariar fundos para as
suas paróquias. Sei que em algumas paróquias se fazem peditórios para financiar
as atividades da LOC/MTC, mas, tais atos, podem-se contar pelos dedos….
A LOC/MTC , a JOC e
outros Movimentos da pastoral operária esperam por vezes meses para que os
Bispos lhes proponham um padre para Assistente. Esperam semanas ou meses para
terem uma reunião de trabalho com o Bispo. Aos dirigentes, e em especial aos
dirigentes livres, pede-se inúmeros sacrifícios pessoais e familiares, quase sempre
vividos numa grande mística e de compromisso… que vai faltando cada vez mais!
Penso que esta interrogação não é apenas minha, até pelo que
ouço de alguns militantes que têm décadas de militância católica. Uma ou outra
vez já partilhei estas interrogações com alguns deles.
A História condiciona as práticas de hoje
A primeira explicação desta situação está na própria
História da Ação Católica Operária em Portugal que em determinado momento para
lutar contra a ditadura de Salazar-Caetano teve de confrontar a Hierarquia Católica.
Nesta dura luta um grupo importante de leigos e padres teve de lutar em duas frentes,
uma no interior da Igreja e outra na sociedade civil, contra o Estado
totalitário!. Ficou a ideia na maioria do clero português de que estes Movimentos
eram todos contestatários e pouco piedosos.
A segunda explicação intrincada na primeira está no facto de
que a Igreja Católica Portuguesa pela Concordata com a ditadura ficou privada
muito cedo de uma Pastoral autónoma. Não pôde criar os seus sindicatos, não pôde
ou não lhe interessou criar um núcleo de padres e leigos preparados para o
mundo do trabalho, um mundo que lhes foi privado muito cedo por Salazar! A Ação
Católica Operária tinha a sua ação vigiada e limitada ao estritamente religioso
e caritativo. Salazar queria um único partido de poder, a oficial União Nacional
onde ele pontificava. Ele temia que a Ação Católica pudesse gerar um Partido
Democrata Cristão com algumas cores de esquerda.
A terceira explicação está na formação do clero português
durante décadas que foi programado e preparado para assistir um campesinato
pobre e sem grandes exigências teológicas e pastorais. Uma formação espiritualista
e ritualista, afastada do mundo real das pessoas, com seminaristas oriundos, na
maioria dos casos, do campesinato português.
Um futuro para a Pastoral Operária?
Desde a Monarquia que a Igreja Portuguesa se desentendeu com
a classe operária, na sua maioria influenciada pelas ideias socialistas, anarcossindicalistas
e republicanas com forte pendor anticlerical.
Os seminaristas
formavam-se sem estudarem de forma crítica a história do Catolicismo Português
e europeu, em particular na sua dimensão social. As vozes proféticas e contestarias
do nosso catolicismo social eram ignoradas com medo da polícia política e da
Hierarquia.
A própria Universidade Católica, que se iniciou com Teologia
e Filosofia, nos anos setenta, não melhorou neste aspeto o currículo dos estudantes.
Existiu uma exceção de pouca duração, o Instituto Superior de Estudos
Teológicos (ISET) de Lisboa e Porto.
Foi do seminário dos Olivais, do Patriarcado de Lisboa, e dos
seminaristas de algumas Ordens Religiosas, nas décadas de 60/ 70, que veio a
maior contestação a uma Igreja cúmplice e aliada de Salazar a quem chamava de «salvador”.
Em geral estes seminaristas tinham ligações a leigos católicos oposicionistas à
ditadura.
Fica claro que estas e outras realidades condicionaram toda
uma cultura de afastamento e incompreensão do mundo do trabalho que faria
sentido ser debatida e avaliada nos dias de hoje para se traçarem novas
perspectivas para a Pastoral Operária.
Nota: Agradeço mais uma vez o convite da LOC/MTC .Foram dois dias de partilha e fraterno convívio!