No actual processo sinodal que atravessa a Igreja católica é fundamental reflectir sobre a situação e o papel dos Movimentos Populares, e muito particularmente dos movimentos operários católicos.Se me perguntarem se os problemas do celibato obrigatório, da participação dos leigos ,do papel das mulheres na Igreja Católica não são assuntos importantes ,direi que são importantes, claro.No entanto, todas estas questões não se podem tornar tão centrais que ofusquem outras não menos importantes como é a questão do trabalho e da emancipação dos trabalhadores.
Em Portugal apenas um reduzido número de cristãos se preocupa e reflecte sobre a «evangelização do mundo do trabalho» que, hoje, não pode ser realizada com a mesma perspectiva do século passado.A própria Hierarquia Católica nunca investiu muito na Pastoral do trabalho, nomeadamente no número de asssistentes dos Movimentos e na sua qualificação, bem como nunca investiu o suficiente no número de dirigentes livres e respetiva formação.
Nos
seminários os futuros padres tinham, e ainda têm,
pouca ou nehuma formação específica para
intervir no mundo das relações laborais.Na década de 70 do século passado
apenas uma escola de teologia, o ISET de Lisboa, extinto em 1975,deu alguma substância á
Pastoral do Trabalho.A Universidade Católica Portuguesa dedica-se à teologia, à
gestão, ao direito, etc. mas muito pouco ao
mundo do trabalho.
A Igreja Católica Portuguesa tanto ao nível paroquial
como ao nível das pastorais específicas e movimentos nunca investiu o
suficiente nos Movimentos Operários.Ainda hoje a pastoral do trabalho continua
a ser a parente pobre da Igreja Portuguesa.A rede caritativa da Igreja absorve
centenas de padres e milhares de cristãos em múltiplos esforços, alguns bem
meritórios.A rede paroquial absorve o trabalho de milhares de padres e até de
religiosos.Quantos padres e leigos trabalham a tempo inteiro para a pastoral do
trabalho?Quantos especialistas em direito laboral e sociologia, quantas
fundações ou centros de investigação para a Pastoral do Trabalho?Podemos contar
tudo isto com os dedos das nossas mãos?
Em Portugal a Igreja Católica quase desertou do mundo do
trabalho.Existem razões históricas para esse facto, nomeadamente a aliança com a ditadura do Estado Novo.Ora, sabemos que o trabalho ainda é o centro da vida de milhões de
portugueses que dele vivem com as suas famílias.Sabemos que é pelo trabalho que, em grande parte, nos podemos realizar e contribuir para a obra da criação.É no
centro mesmo do conflito laboral que se pode exprimir o amor cristão.É na luta
contra a exploração e pela diginidade dos trabalhadores que se exprime o amor
ao próximo.É na luta pela distribuição equitativa da riqueza que e exprime
a solidariedade e a justiça.É na luta por leis justas e democráticas que
se pode exprimir a dignidade e liberdade do ser humano.Então qual a razão ou
razões para não se investir na Pastoral do Trabalho?Qual é o medo?
Deixo a resposta ao leitor que, por acaso, me leia.Leigos e clero, com algumas excepções conhecidas, nunca viveram uma relação dependente de trabalho,trabalham de forma liberal,sem horários de fábricas ou escritórios e chefias.Na época dos padres operários a experiência foi vista como subversiva e não adequada para o clero.As suas vivências com os pobres e excluidos são frequentemente numa posição paternalista, de ajuda, não de companheiro de um processo libertador e emancipador.
Uma Pastoral do trabalho consistente com meios humanos, técnicos e
financeiros é fundamental para que se possa fazer uma boa reflexão da realidade laboral à luz
da fé cristã.Hoje, mais do que nunca, o método «ver, julgar e agir» exige em
todas as etapas fundamentação nas ciências sociais, para além da insubstituível
experiência e saberes dos trabalhadores e dos sindicalistas.
O Sínodo não pode passar ao lado desta realidade, ignorando os dramas e problemas do mundo do trabalho e dos trabalhadores.
Nota: a primeira versão deste texto foi publicada no Voz do Trabalho da LOC/MTC
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