
O documento organiza-se tematicamente
procurando dar uma imagem de modernidade do governo,dando relevo nomeadamente a
temas actuais como o desafio demográfico,as desigualdades e o digital.Como
estratégia de fundo procura aparentemente uma aproximação aos aliados da
«geringonça».
No entanto,o programa não deixa de ser uma
abordagem tecnocrática da economia e do trabalho,fazendo da educação,à boa
maneira republicana, a chave do combate às desigualdades e da promoção da
igualdade de oportunidades.Este enfoque deixa-nos algo apreensivos.
O trabalho e os trabalhadores são remotamente
focados dando lugar às clássicas medidas de apoio ao emprego, à concertação social
para onde será remetida a tímida política laboral da legislatura.O perfil da
própria Ministra do Trabalho é muito significativo.Uma pessoa competente em matéria laboral, sob ponto de
vista técnico, mas com pouca experiência política e pouco peso no governo.
Por outro lado, as medidas que são
apresentadas são na generalidade vagas e sem metas de concretização.Muitas
delas são para ir concretizando, ou não, à medida dos ventos sociais.O aumento
do salário mínimo de 750 euros é, talvez, uma das poucas medidas quantificadas.
Subjacente a esta estratégia está a vontade já
manifestada de realizar no futuro um acordo na Concertação social sobre
rendimentos, nomeadamente salários e pensões, bem como sobre a negociação
colectiva.Tudo indica assim que não haverá espaço para novas alterações à
legislação laboral repondo o que se perdeu no governo de Passos/Portas no
quadro da Troika.O argumento principal que tem a nova ministra Ana Godinho é
que teremos que esperar para ver os efeitos no terreno das recentes alterações,
nomeadamente sobre a contenção da precarização das relações laborais, banco de
horas etc.
Numa primeira leitura o Programa não prevê
grandes alterações na área das relações laborais, embora o novo governo se
confronte mais adiante com a realidade da precariedade que pode aumentar, bem
como o trabalho clandestino.Isto para não falar de todo o sector das políticas
de segurança e saúde no trabalho que o Programa quase ignora.
Perante este documento os sindicatos vão ter
que definir a sua estratégia para que algumas «boas intenções» sejam
efectivadas e outras menos boas sejam simplesmente esquecidas.Relativamente ao
salário mínimo o governo parece que já tem números na cabeça.Porém, nem patrões
nem sindicatos vão estar de acordo com as propostas do executivo.
Quanto a um acordo sobre política de
rendimentos neste momento, e caso a economia cresça a ritmo aceitável,não vai
interessar aos sindicatos.Estes, pelo menos os da CGTP e alguns independentes
não vão querer ficar com um colete de forças, agarrados a um referencial que
serve de bitola para calar as reivindicações justas em sectores onde claramente
se tem feito dinheiro mas os trabalhadores pouco ou nada beneficiam dessa
riqueza.
E sobre esta questão ainda temos um problema
crónico de difícil resolução que é a representatividade das organizações
patronais e sindicais que assinarem esse acordo.Sem efectiva representatividade
os acordos não passarão do papel e apenas servem para travar as lutas sociais.
O Programa do governo tem, no entanto,
potencialidades para um efectivo diálogo
que não seja uma caricatura do mesmo.É fundamental dinamizar a contratação
colectiva e fazer acordos sobre questões sectoriais como aspectos da
qualificação e emprego dos jovens, doenças profissionais ,riscos psicossociais e
acidentes de trabalho,transição digital, dignificação das carreiras na Função
Pública.É importante preparar medidas contra a precariedade e o trabalho
clandestino, dar meios e quadro legal para uma ACT mais activa.Se o documento
não passa de um conjunto de «boas intenções» a relação com o Movimento Sindical
vai ser difícil.Porém, se subjacente ao mesmo existir uma genuína vontade de
dignificar o trabalho e os trabalhadores então existe caminho para caminhar.
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