A recente minicrise que envolveu o conflito
entre o pequeno sindicato dos motoristas das matérias perigosas e os seus
patrões revelou alguns aspectos que
merecem reflexão e debate político sindical.
Em primeiro lugar esta crise acabou por ser
bem gerida pelo governo que evitou uma situação políticamente embaraçosa na
quadra da Páscoa, com um aumento da mobilidade das famílias e reforço do
turismo e, portanto, do aumento do consumo de combustível Algumas forças
«anti-geringonça» esfregavam as mãos de contentamento perante uma situação
desgastante semelhante aos incêndios do ano passado!
Em segundo lugar esta crise mostrou quanto o
País está dependente da rodovia, nomeadamente esquecendo a alternativa ferroviária
que nestas circunstancias poderia resolver alguns problemas.
Em terceiro lugar este esboço de caos mostrou
quão impreparados estão os portugueses para enfrentarem situações deste
género.Filas longas de carros nos postos de abastecimento, com pessoas a
atropelarem-se,gente temendo que não pudesse ter comida nos supermercados,
enfim, gente quase a entrar em pânico com uma pequena ameaça.Decididamente não
estamos preparados como povo para uma prova mais dura, uma catástrofe da
natureza ou uma crise social e política.
Em quarto lugar toda a gente ficou a conhecer uns 800 trabalhadores que há muitos
anos trabalham todos os dias a transportar matérias perigosas , que em alguns
casos são autênticas bombas.Eram ignorados mas eles descobriram que têm muito
poder.O poder de paralisar um país caso seja necessário.Existem outros casos e
situações semelhantes de grupos de trabalhadores que são subalternizados até
pelas suas próprias macro organizações sindicais.Pelo que fazem e pelos perigos
que correm não têm direito a uma categoria própria?Não têm direito a uma
remuneração justa?
Em quinto lugar esta situação mostrou que não
basta andar com bandeirinhas e manifestação para aqui e para acolá num
sindicalismo demasiado conformista e bem comportado políticamente. Há efectivamente
sectores, grupos de trabalhadores descontentes com a situação.A economia
cresceu, as exportações aumentaram, deceu o IVA para alguns sectores, aumentou
enfim a riqueza,mas os salários são lentamente repostos e apenas com
ajustamentos ou aumentos pouco significativos.Veja-se o sector do turismo e
restauração, calçado vestuário, transportes e energia, entre outros.São muitos
os trabalhadores com o salário mínimo e este tornou-se numa referência para
contratar inclusive os jovens licenciados.
Finalmente esta situação mostrou que tal como
no caso dos estivadores e dos enfermeiros há sectores de trabalhadores
descontentes e que se deram conta que têm nas suas mãos um grande poder se
estiverem coesos e conscientes da sua força.São sindicatos com alguma
distanciação relativamente ás centrais sindicais e às suas estratégias.
É natural que outros grupos de trabalhadores
decidam destacar-se das grandes organizações e lutar por sua conta.Um
risco terão que evitar:ver apenas os
interesses imediatos da sua classe adoptando um corporativismo cego sem terem
em conta a situação política concreta e os interesses mais gerais dos
trabalhadores dando «tiros nos pés»e, ou seja,dando azo a futuras limitações ao direito de greve ou ao alargamento inaceitável
dos serviços mínimos.
Uma perspectiva se desenha: tanto a CGTP como
a UGT terão que repensar em alguns sectores as suas estratégias de organização
sindical.Fazer macro organizações onde se metem todos os grupos possíveis de
trabalhadores tem algumas vantagens, nomeadamente de controlo, negociação e de
gestão dos recursos.Todavia, os diferentes grupos que integram uma federação,
por exemplo, terão que ser considerados nos seus interesses específicos.Hoje
mais do que nunca!
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