segunda-feira, 23 de novembro de 2015

INSPEÇÃO DO TRABALHO PORTUGUESA: elementos para a sua história! (I)

A inspeção do trabalho portuguesa está ligada a um século de história das condições de vida e trabalho dos trabalhadores portugueses. Nascida em março de 1916, em plena Primeira República, enquanto estrutura da administração do trabalho e no âmbito da criação do novel Ministério do Trabalho e Previdência Social, ela tem as suas raízes nas últimas décadas do século XIX e , muito particularmente,  num diploma publicado a 22 de abril de 1891.
Com efeito, nos últimos vinte anos do século XIX acentuou-se a modernização da economia capitalista portuguesa e tornou-se evidente aos olhos de importantes setores da sociedade as péssimas condições de trabalho existentes em todos os locais de trabalho com especial destaque para os chamados estabelecimentos industriais. Homens, mulheres e crianças trabalhavam sem horários ou com horários extensos de 14 e 16 horas, em condições higiénicas deploráveis e arrasadoras para a saúde, em particular para as crianças e jovens. É neste quadro da chamada «Revolução industrial», chegada a Portugal quase com um século de atraso, que nasce a «questão social» e emergem as primeiras associações operárias e greves, os primeiros intelectuais preocupados com a situação operária e trabalhadora em geral (geração de 70) e a Encíclica «Rerum Novarum» do  Papa Leão XIII.
Assim, nos finais do século XIX e durante os anos que precederam o fim da Monarquia e a implantação da República foram vários os diplomas que procuraram regulamentar o trabalho de menores e das mulheres, em particular no que respeita aos horários de trabalho, insalubridade dos estabelecimentos, trabalho noturno das mulheres. Em alguns destes diplomas, primeiro núcleo do futuro direito do trabalho, aparecem as primeiras preocupações de fiscalização das condições de trabalho, sendo elas bem evidentes no diploma de 1891,onde são claramente definidos os poderes e competências dos inspetores.
Estas competências são novamente referidas e até aperfeiçoadas no diploma de 1895 sobre higiene e segurança do trabalho no setor da construção e obras públicas, onde se estabelece que o inspetor deve verificar os equipamentos de trabalho, inquéritos de acidentes e elaboração de estatísticas, entre outras importantes funções.
Até finais do século XIX ocorre ainda a primeira revolta republicana (31 de janeiro de 1891) realizam-se alguns congressos operários (1891 e 1894) e o reconhecimento do direito de associação de classe (1891).

A Primeira República foi um tempo de sonhos!

Em 1910 é implantada a República Portuguesa e um inquérito da Direção Geral do Comércio e Indústria revelava as terríveis condições de vida e de trabalho do operariado: ausência de contrato de trabalho, pagamento á jorna ou empreitada, baixos salários, trabalho feminino e infantil, duração do trabalho entre as 10 e 12 horas, não distinção entre trabalho noturno e diurno, elevada sinistralidade e morbilidade. Eram tempos de capitalismo selvagem!
Em 1911 Portugal tinha cerca de 6 milhões de habitantes com 70% da população analfabeta. Neste mesmo ano é publicada a Constituição da República e o descanso semanal obrigatório.
O período de 1912 a 1914, ano do início da Primeira Grande Guerra Mundial, é um tempo de grandes movimentos grevistas, procurando o movimento operário retirar vantagens da nova situação.Houve aumento geral de salários! Em 1913 é estabelecida pela primeira vez a responsabilidade patronal pelos acidentes de trabalho. O diploma em questão não refere qualquer responsabilidade no domínio inspetivo. Em 1914 é criada a primeira central sindical portuguesa, a União Operária Nacional, já em conflito aberto com os governos republicanos que se viriam a mostrar muito duros com o movimento sindicalista de inspiração anarquista.
Entre manifestações contra a carestia de vida (1915) e a declaração de Guerra a Portugal por parte da Alemanha (1916) é criado o Ministério do Trabalho e Previdência Social que integra a Direção Geral do Trabalho e a inspeção do trabalho com a atribuição da fiscalização das leis do trabalho e cujo diploma (Lei 494 de 16 de março) é considerado como a criação oficial desta instituição que faz agora um século.
De 1916 a 1919 Portugal vive um conjunto de acontecimentos com importância social e política de relevo. É a participação do exército na Grande Guerra, os ecos da Revolução Russa (1917), a ditadura militar de Sidónio Pais e o seu assassinato (1918), a greve geral do mesmo ano, a criação da CGT (1919) e as consequências da economia de guerra que durariam por alguns anos.Os trabalhadores portugueses tiveram anos de grandes dificuldades....

A criação da Organização Internacional do Trabalho (1919), de que Portugal é membro fundador, é considerada um marco de especial importância na medida em que, para além da sua inovadora estrutura tripartida, onde têm assento patrões, trabalhadores e governos, inicia-se um novo capítulo do direito do trabalho com as primeiras convenções aprovadas por aquela Organização Internacional. Convenções que visam precisamente responder de forma universal aos problemas laborais mais prementes da «questão social» como o trabalho de menores e mulheres, trabalho noturno e horários de trabalho. A OIT viria a ser fundamental em anos seguintes na definição do estatuto das inspeções do trabalho.
Com o crepúsculo da Primeira República, em 1925, é extinto o Ministério do Trabalho e Previdência Social, sendo a Inspeção do Trabalho substituída pela Repartição da Política Social do Trabalho com funções de fiscalização do trabalho.(continua)


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