terça-feira, 13 de agosto de 2013

QUE DEMOCRACIA QUEREMOS?

Todos sentimos que a democracia representativa está esvaziada e existe um fosso enorme entre
os portugueses e o sistema político saído da Revolução de 1974. Este divórcio tem aumentado dramaticamente nos últimos tempos, agravado com a perda de soberania decorrente dos acordos com as instituições financeiras internacionais. Afigura-se-nos urgente alterar esta situação de modo que o sistema democrático represente de forma adequada as necessidades, anseios e interesses de todos os cidadãos e promova o bem comum. 

Pela experiência que temos como povo, podemos dizer que a democracia e o exercício da cidadania não se esgotam no voto. Aliás, esta questão foi entendida pelos constituintes de 1976, consignando a participação dos cidadãos, desde o local, comunitário ao nacional, como fundamental. Mais, a democracia não se esgota na participação política. Ela exige, para ser completa, enquanto elemento de progresso e de emancipação, a democracia cultural, económica e social. Para além de, em particular no ocidente, exigir a articulação entre a experiencia de democracia representativa e de democracia directa. Daí que se coloquem vários desafios para, a partir da experiência e do debate, se consigam mecanismos que favoreçam essa articulação. Neste caminho, ao longo de décadas, não podemos ignorar a longa e rica experiência do movimento operário e sindical, nas suas diferentes correntes de pensamento, de prática social e política. Assim como não se pode ignorar a nossa experiência ao nível do poder local, da economia social e do associativismo, das comissões de moradores, da autogestão e outras. 

Melhorar a democracia participativa nos locais de trabalho! 

 A democracia representativa ocidental, com nuances de país para país, admite no seu quadro jurídico formas de participação dos trabalhadores. Formas essas limitadas, que raramente vão muito mais além da informação e consulta, consignada nos: comités de empresa, comissões de trabalhadores, secções sindicais, comissões de segurança e saúde no trabalho, comités europeus, etc. Assim, a evolução ultra-liberal verificada nas últimas décadas, vai no sentido de limitar, reduzir e até anular este tipo de representação e participação laboral. Aliás, constata-se, num movimento convergente, com o esvaziamento da democracia representativa. Tal como num laboratório com vasos comunicantes as dinâmicas democráticas numa sociedade estão interdependentes. 
Na crítica que se faça ao actual estado da democracia política deve incluir igualmente a crítica ao estado da democracia no trabalho, ou da não democracia no estado capitalista. A articulação entre democracia representativa e participativa deve abranger também a necessidade de se desenvolver a participação dos trabalhadores nas empresas e a mobilização, sempre que possível, para formas de democracia directa e de autogestão. Não apenas de informação, portanto, mas também de co-decisão e de autogestão! Nesta perspectiva, a autogestão, entendida de uma forma ampla, é uma pedagogia/praxis fundamental para a autonomia e emancipação dos cidadãos na produção e na vida social. A autogestão é também o horizonte democrático e de participação para toda a sociedade! E as empresas do Estado e da economia social deveriam ser as pioneiras de formas de participação, nomeadamente de autogestão!

 Valorizar todas as experiências de participação 

A luta pela democracia participativa em Portugal deve assim revitalizar a nossa memória como povo e das suas experiências, claramente no «O Povo é quem mais ordena». Deve também valorizar todas as experiências actuais de participação levadas a cabo por grupos e associações da economia social e solidária no nosso país e no mundo. A luta pela articulação da democracia representativa e participativa exige uma maior defesa e apoio às comissões de trabalhadores e sua ligação aos sindicatos. Esse apoio passaria por facilitar a constituição legal de comissões, consideradas actualmente, um pesado fardo burocrático. O mesmo seria desejável para outros espaços de participação, tais como os representantes dos trabalhadores para a segurança e saúde no trabalho.
Este aprofundamento da participação deve ser também um dos objectivos do movimento sindical, procurando fomentar a participação de todos os trabalhadores nos locais de trabalho, tornando a mesma elemento estruturante da cultura laboral. Afigura-se-nos importante que algumas empresas em crise poderão ser tomadas pelos seus trabalhadores, caso exista essa cultura laboral. Lutar pelos postos de trabalho e governar a empresa é um objectivo produtivo e pedagógico fundamental, caso os trabalhadores o desejem. Assim, exigir mais participação na vida da empresa, inclusive na participação dos seus resultados, é justo e desejável! 

A empresa moderna não é apenas dos accionistas ou do Estado. É também dos trabalhadores, dos consumidores e outros cidadãos directa ou indirectamente relacionados com ela. A luta pela democracia participativa exige um novo quadro de apoio económico e fiscal para a economia social e solidária. Os cidadãos precisam também de valorizar e aprofundar a vivência democrática, combatendo a gestão pessoalista destas unidades, reduzindo a intromissão do Estado nas mesmas e melhorando a sua gestão técnica. 

*Contributo para o debate sobre a Democracia que Queremos, tema do Encontro de Palmela entre movimentos e associações e partidos políticos realizado no dia 27 do passado mês de Julho

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