sexta-feira, 7 de maio de 2021

ALENTEJO-de terra da fraternidade a terra da indignidade!

Nas últimas décadas o Alentejo sofreu diversas transformações económicas, migratórias e


demográficas que estão na base dos problemas sociais, sanitários e políticos, com destaque para a situação de milhares de imigrantes .Neste século progrediu uma agricultura capitalista, de exploração intensiva, destruidora do ambiente e muito virada para a exportação.Empresas nacionais e estrangeiras com capital investiram forte em vários produtos com mercado nacional e internacional.

Por diversas vezes uma ou outra reportagem fazia emergir os problemas sociais  dos imigrantes com particular acuidade na grande bolsa de Odemira.Problemas sanitários, de habitação, de exploração laboral, de máfias , enfim de trabalho negro.Uma ou outra vez o SEF, IEFP e a ACT fizeram raides naquelas regiões para colocarem alguma regulação na selvajaria laboral que existia e da qual apenas víamos a ponta do icebergue.

Responsáveis políticos fecharam os olhos

Falar do problema e da situação dos imigrantes  foi sempre  incómodo para os senhores da CAP, confederação dos grandes agricultores de Portugal,e para os ministros do trabalho e da agricultura, em particular para o Srs.Drs. Viera da Silva, Bagão Félix , Mota Soares e Gomes da Silva e outros.Muito discretamente fazia-se sentir aos dirigentes da ACT e do SEF que tais ações de fiscalização não eram bem vindas, davam uma imagem negativa do país,enervavam as empresas agrícolas empreendedoras que até estavam a contribuir para o nosso PIB.A situação mais caricata foi há uns anos com a história do drone utilizado pela ACT para detetectar trabalhadores clandestinos nos campos do Alentejo e Ribatejo.Veio logo gente graúda dizer que a utilização de drones sobre a propriedade privada era um grave atentado à privacidade e à propriedade.Ainda hoje nos meios sindicais e da ACT se fala desta questão com um sorriso.

Tratava-se de detectar mafiosos que exploram trabalhadores, de grandes agricultores e de empresas de trabalho temporário que fechavam os olhos à indignidade de roubar os salário de quem trabalha, de lhes reter o passaporte e outros documentos, enfim, de os tornar escravos com salários de miséria e horários bem longos.

Não, a política foi a de atirar o assunto para debaixo de tapete.Bem falavam os autarcas impotentes para resolverem os problemas, bem falou o ex-Bispo de Beja, Vitalino Canas, denunciando a exploração e o tráfico de seres humanos, a Cáritas de Beja e o actual Bispo ,João Marcos, a CGTP e a ONG Solidariedade Imigrante e outros sindicatos da região.

Não foi suficiente.O Portugal moderno e lisboeta estava cheio de vaidade pela sua agricultura no Alentejo, onde a máxima baboseira foi a da Ministra de Agricultura de Passos Coelho, Assunção Cristas, fazer visitas a essas explorações agricolas apontando-as como o modelo agrícola do Portugal da Troika.

Em 2016, com a lei 28 de 23 de agosto, com o governo de António Costa, e por força da sua aliança á esquerda, procurou-se dar suporte legal a uma melhor ação da ACT e do SEF na responsabilização dos vários actores na relação de trabalho agrícola, comprometendo os proprietários agrícolas, empresas de trabalho temporário e empreiteiros.

Veja-se o título do diploma que é esclarecedor da nossa cultura de amor legislativo:«Combate às formas modernas de trabalho forçado, procedendo à décima primeira alteração ao Código do Trabalho, aprovado pela Lei n.º 7/2009, de 12 de fevereiro, à quinta alteração ao regime jurídico da promoção da segurança e saúde no trabalho, aprovado pela Lei n.º 102/2009, de 10 de setembro, e à terceira alteração ao regime jurídico do exercício e licenciamento das agências privadas de colocação e das empresas de trabalho temporário, aprovado pelo Decreto -Lei n.º 260/2009, de 25 de setembro».

Mas se procurarmos ver quais as ações que a ACT e o SEF levaram a cabo para combater essas formas modernas de exploração laboral não serão muitas.O combate, prometido pelo diploma, quase não saltou do papel.

Agora com o surto de covide naquela região rebentou o dique e toda a gente escreve e fala sobre o assunto.O interessante é verificar que todos os principais responsáveis ou lavam as mãos e choram lágriamas de crocodilo ou estão caladinhos.Daqui a um mês já não se falará no problema.

Denunciar as situações de indignidade e exigir actuação das autoridades públicas

O Presidente quer saber, coisa que nunca o interessou na vida,o Primeiro Ministro quer que o surto acabe até porque veio em má altura, precisamente no momento da realização da Cimeira Social no Porto.Por acaso temos uma Ministra da Agricultura?Afinal, temos os mesmos problemas com os imigrantes agrícolas que a Itália e a Espanha.Não se sabe quantos acidentes de trabalho sofrem, nem que doenças profissionais os afectam,nem quantos são os ilegais e os legais.Pouco nos interessa que falem português ou inglês,que vivam em habitações sobrelotadas e recebam pouco ou muito salário.

Mas não nos enganemos.A situação indigna dos imigrantes não é apenas do Alentejo mas de muitas outras regiões do país , nomeadamente no Ribatejo, na Região Oeste, na Margem Sul, no Alto Douro.Há que pôr cobro a  situações de exploração e de indignidade!Temos que as denunciar e exigir que as autoridades actuem e não tenham medo dos poderosos.

Este problema não é apenas dos autarcas, dos governantes e da oposição.É de toda a sociedade portuguesa.Convivemos demasiado bem com o mal dos outros, em particular se forem pobres e de países distantes.Fecahamos demasiado os olhos àquilo que pode enegrecer o nosso país.A pandemia ajudou a esta cultura nada cívica de deixar andar o mundo e cuidar da minha vidinha, do meu cachorro e pouco mais.Como cidadãos conscientes não podemos calar situações como as que se passam com estas pessoas que vieram para o nosso País para ganhar o pão nosso de cada dia e contribuir para a nossa riqueza!

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