Refiro-me concretamente à realização da Festa
do Avante e ao manifesto «Em defesa das liberdades de educação» assinado por
várias pessoas bem conhecidas como
Cavaco Silva,Passos Coelho, o Patriarca de Lisboa,Manuela Ferreira Leite, o
Bispo de Aveiro ,Nuno Júdice,etc.Ambas as iniciativas provocaram vários
comentários e artigos na comunicação social, com destaque para a Festa do
Avante.
Para além da opinião que se possa ter sobre a
realização da Festa em tempo de pandemia, a iniciativa permitiu um forte ataque
político ao PCP vindo em geral da direita, e,em particular dos sectores mas
conservadores desta.Pode ter criado , de facto,em alguns sectores da população
a percepção de que os comunistas não abdicam das suas iniciativas mesmo que
possam ter um risco elevado para eles e para os outros.E também insistindo em
que o governo de Costa foi neste caso facilitador a até cúmplice desta
iniciativa.O artigo de Paulo Rangel, alto dirigente do PSD, no Público de 1 de
setembro, é ilustrativo desta ataque.
Por outro lado o manifesto agora divulgado em
defesa das liberdades na educação vem mostrar que uma parte da direita portuguesa tem hoje
comportamentos semelhantes à seita religiosa «mormon» dos Estados Unidos, ou
«talibans do Afeganistão» e querem educar os seus rebentos nas suas crenças, sem
pecado, isolados da restante sociedade e não partilhando o que eles consideram
uma «cultura marxizante» que, segundo eles, domina a sociedade portuguesa e
ocidental.
Os signatários do referido abaixo-assinado,
com figuras de proa da direita conservadora e da extrema direita pretende
apelar aos pais que utiizem a objecção de consciência, prevista na nossa
constituição, para boicotarem a disciplina escolar de Cidadania e Desenvolvimento
porque esta cadeira contém conteúdos como trabalho e economia, direitos
humanos,igualdade de género (ui), sexualidade e outras matérias sobre as quais
todos os cidadãos devem ter informação básica.
Ora, nós vivemos numa República laica e
constituida por cidadãos com direitos iguais e oportunidades.A escola, pública
ou privada, forma pessoas para poderem exercer uma profissão em dignidade e
cidadãos com direitos e deveres.Não podemos abdicar de uma cadeira que transmite
conhecimentos básicos sobre setas questões.Podemos debater e até discordar dos
conteúdos ou de alguns conteúdos dessa cadeira.Podemos em casa falar de outros
assuntos e até de outras propostas com os nossos filhos,mas não podemos
objectar uma cadeira de cidadania.
Em Portugal qualquer aluno, português ou
imigrante,cigano, preto, indiano, branco ou betinho deve fazer a cadeira de Cidadania
e Desenvolivimento.
Direita conservadora quer marcar a agenda política
Mas, o mais importante é saber que a direita
conservadora está a trabalhar para marcar a agenda política e ideológica.É nos
jornais e televisões que melhor se nota esta estratégia de combate ao que eles
consideram uma ideologia progressita de «igualitarismo,de género,do
politicamente correcto, de dissolução dos valores tradicionais como autoridade
e pátria.Um combate que junta a velha extrema direita com os sectores mais
modernos e conservadores da direita empresarial e intelectual e que, a prazo,
têm como objectivo o assalto ao poder.
Infelizmente uma parte da esquerda consola-se
com a governação e tira daí proveitos.Uma outra parte vive entrincheirada num
forte e considera-se vítima de um ataque político e ideológico.Uma terceira
parte vive ao deus dará, sem rumo e sem norte.
Ora , a melhor defesa é o ataque.É tempo de se
colocarem outros temas na praça pública como o rendimento básico e universal, o
aumento do salário mínimo nacional, o estabelecimento de critérios para um salário
mínimo europeu, o reforço do poder
sindical e participação nos lucros dos trabalhadores nas empresas, o
teletrabalho devidamente regulado e compensado,os apoios á digitalização e
formação dos trabalhadores, o direito de todos a um médico de família, a saúde
no trabalho, a melhoria da proteção dos desempregados, a situação nos lares de
idosos.Será que a esquerda, nomeadamente o governo minoritário do PS, ficou sem
ideias para além das eleições indirectas para as regiões, o orçamento do
estado, os fundos europeus?
Finalmente uma palavra para lamentar que altos
dirigentes da Igreja Católica em Portugal assinem um papel com este
objectivo.Ou não viram bem o problema ou foram enganados.Este manifesto não vem
na linha do Vaticano II, nem do Papa Francisco.Está na linha dos católicos que
se opuseram à República e ainda não convivem bem com a escola pública, e com o
direito universal á educação, um direito fundamental dos direitos humanos.
Mais grave ainda é que estes dignatários da
Igreja Católica vão no carro político dos sectores mais conservadores da
sociedade portuguesa.Não digam, porém, que tal manifesto, com tal companhia, não é
uma posição política!
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