Para se entender a greve convocada para o dia
12 de agosto por dois sindicatos de motoristas, em particular a dos que
transportam matérias perigosas, teremos que referir alguns antecedentes
ocorridos nos últimos tempos, nomeadamente a greve da Páscoa passada que
colocou o País à beira de um ataque de
nervos e o governo PS na corda bamba.
Em primeiro lugar não havia memória de uma
greve neste sector ameaçando parar o País com pesadas consequências para a
economia e para a vida dos portugueses.As greves ocorridas nos transportes até
então apenas deram aborrecimentos aos peões, ou seja aos trabalhadores mais
pobres, os que viajam pra o trabalho nos transportes públicos.As empresas de
transportes pouco afectadas são com greves de um ou dois dias, pois a maioria
dos trabalhadores usam o passe mensal.Estas greves, porém, mexem também com a
vida das classes médias altas e poderiam prolongar-se no tempo, afectando
duramente as empresas do sector.
Novos protagonistas sindicais tinham aparecido
entretanto nos últimos anos devido ao descontentamento com a falta de eficácia
reivindicativa da FECTRANS para o sector.Em segundo lugar a greve em abril e a
de agosto pretendiam aproveitar o actual contexto político cujos pontos altos
seriam maio (eleições europeias) e outubro para as legislativas. Esta questão é
muito importante porque a propósito várias teorias conspirativas se ergueram,
desde que os motoristas eram manipulados pela CIA ,até que pretendiam deitar
abaixo a inédita «geringonça».
Tais teses, ou narrativas como agora se diz,
espalhadas pelas redes sociais vinham particularmente de gente de esquerda o
que é ofensivo para a classe pois levam ao afastamento e revolta de muitos
motoristas.Muitas das tiradas referiam inclusive o assessor do sindicato, um
tal Pardal Henriques, e a sua influência
política maligna.Lamentáveis tais diatribes porque, pese a figura ser estranha
e desagradável, alguém tem dúvida da influência não apenas jurídica mas também
político-partidária de muitos advogados de sindicatos ao longo da história?
Os objectivos e reivindicações dos
motoristas de matérias perigosas
A comunicação social desde cedo fez o cerco
aos motoristas tomando partido no conflito.Deu informações contraditórias,
alarmou, instigou a tomar medidas «robustas» e «musculadas» como definia um
director de um diário.
Todavia, não faltaram notícias sobre os
vencimentos de motoristas e sobre as suas reivindicações mais emblemáticas.Houve
críticas porque ganhavam muito, mas o salário base,630 euros, pouco passa do
salário mínimo actual.Há anos que andam nestes valores, sem aumentos sérios
deitando as empresas mão de subsídios e ajudas de custo para os obrigar a
trabalhar mais por menos dinheiro.Exigir primeiro dois salários mínimos, e
depois já aceitavam 900 com aumentos de 100 euros nos anos seguintes,são
exigências irrealistas depois de tantos anos de estagnação salarial?
Melhorar a sua situação salarial, condições de
trabalho e o seu estatuto especial no âmbito dos motoristas são reivindicações
mais que justas dadas as caracteristicas da sua profissão de risco.Profissão de
risco que exige formação e certificação especial.Profissão que deve ser
valorizada salarialmente e não com subsídios de risco que, na minha opinião,
deveriam ser absolutamente banidos em todas as profissões.O que se exige da
entidade patronal é o exercício do trabalho em segurança e saúde, evitando o
trabalho em excesso, a fadiga crónica,os problemas músculo-esqueléticos que
ficarão para toda a vida.Estes homens não são máquinas, são pessoas com família
e com um corpo que adoece e morre.Não são brutos insensíveis como muitos pensam,mas
pessoas com sentimentos, uma cultura própria e fortemente classista e não se
deixam manipular por qualquer advogadozito.
Medo do governo levou a serviços mínimos
exagerados
A greve de abril levou patrões e governo a
prepararem-e devidamente para a de agosto.Viram nesta greve, em particular o
governo, um desafio político que sendo superado esmagaria as veleidades dos
motoristas atrevidos e suspeitos.Neste sentido os patrões e governo
aproveitaram o facto da greve dos motoristas de matérias perigosas ter um dia
para começar mas não apresentar um dia para acabar.Uma greve que ,sendo legal,
tem um certo carácter subversivo mesmo para os especialistas em fazerem greves
há muitos anos e para os especialistas em direito constitucional, bem
instalados nas suas poltronas.Perante esta forma radical de avançar com a greve
o governo respondeu com toda a «artilharia» ao seu dispor, nomeadamente fazendo
declarações pouco consentâneas com a sua missão que é promover o diálogo e
arbitragem entre as partes até ao último momento.A atitude do governo mostrava
claramente que iria actuar «robustamente» o que deu um certo conforto desde a primeira hora à ANTRAM.
E assim aconteceu, pois esta entidade patronal
também se radicalizou desde a primeira hora visando humilhar e derrotar os
motoristas.A definição de serviços mínimos , que são máximos,foi a gota de água
num conflito ainda anunciado mas já em brasa.De certo modo com serviços mínimos
que vão desde 50 a 100% a greve foi esvaziada retirando grande eficácia á luta
dos motoristas.Mesmo assim os motoristas decidiram em plenário, coisa que nem
todos os sindicatos fazem,avançar com a greve.Por unanimidade!Vamos ver o
desenrolar dos acontecimentos.Não posso deixar, no entanto, de dizer que o
governo foi demasiado longe com estes serviços mínimos ferindo o direito
constitucional à greve.Tendo por missão garantir o quadro da legalidade e os
serviços essenciais, o governo tinha sempre à mão a «bomba anti sindical», a
requisição civil, para não deixar que o caos porventura se instalasse ou alguma
força estranha tivesse a intenção de qualquer golpe anti democrático.
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