terça-feira, 12 de agosto de 2025

REFORMA LABORAL DO GOVERNO NÃO PENSA NO FUTURO! APENAS EM LUCROS IMEDIATOS!

 

«No fundo, trata-se de modernizar o mercado laboral, adaptando-o às formas de trabalho emergentes. Creio, porém, que isso não chega: o Código do Trabalho necessita de alterações mais profundas. Bem sei que, desde a sua criação em 2003, este código já foi revisto e alterado várias vezes. Mas são recorrentes os apelos das organizações internacionais, como a Comissão Europeia e a OCDE, para a flexibilização da legislação laboral e consequentemente da organização do trabalho, desde a contratação à prestação das atividades.

Flexibilização, essa, que é vista como um incentivo à produtividade e competitividade da economia e à sua capacidade de criação de emprego.

O mercado de trabalho português permanece fortemente segmentado entre trabalhadores efetivos e trabalhadores a prazo. Os trabalhadores com contratos sem termo beneficiam de um dos mais altos níveis de proteção da Europa, o que incentiva o trabalho a termo. 

O despedimento com justa causa ou por extinção do posto de trabalho continua a ser juridicamente complexo e arriscado para o empregador, enquanto a contratação permanente exige processos administrativos e legais demorados. 

A legislação laboral portuguesa incentiva os contratos a termo e os falsos recibos verdes, enquanto protege exageradamente os trabalhadores que estão dentro do mercado de trabalho e, simultaneamente, impede a entrada dos que estão fora.

Perante isto, há que clarificar as condições objetivas que permitem a uma empresa dispensar, por imperativos económicos e financeiros e de desempenho (do trabalhador), um trabalhador com contrato permanente. Devido aos entraves colocados à dispensa de trabalhadores, nomeadamente jurídicos e pecuniários, as empresas retraem-se na hora de empregar novos trabalhadores…. («Flexibilizar ou estagnar» artigo de Armindo Monteiro, Presidente da CIP, no Dinheiro Vivo a 18 de julho de 2025).

 

 

Neste pedaço de texto temos o programa antiquado dos patrões portugueses para a revisão da legislação laboral que eles consideram ainda pouco flexível, após décadas de alterações jurídicas sempre a


flexibilizar a favor das empresas!

Indo mais uma vez ao encontro dos apelos dos empresários o governo AD apresenta um primeiro projeto de contrarreforma que não moderniza em nada o mercado de trabalho, precariza ainda mais a vida dos trabalhadores e não investe na sua formação e requalificação.

O argumento de Armindo Monteiro de que a proteção dos trabalhadores impede o emprego e fomenta o trabalho precário é falso. Se impedisse o emprego não teríamos uma das taxas de desemprego mais baixas da Europa! Por outro lado, a solução que ele apresenta para combater a precariedade, os contratos a termo, é a desproteção dos que estão justamente protegidos, ou seja, permitir o despedimento de qualquer maneira, sem justa causa, a belo prazer da empresa.

Não são os trabalhadores permanentes que impedem a entrada dos precários, são os empresários que não querem investir nos trabalhadores dando-lhes estabilidade, boas condições de trabalho e formação.

Vejamos concretamente alguns aspetos que, sendo importantes para as empresas e para a sua competitividade, não são importantes nem para este governo, nem para os patrões!

 

E a requalificação dos trabalhadores portugueses?


Como muito bem ilustra o sindicalista Ulisses Garrido num artigo no jornal Público de 11-08, este projeto laboral do governo não aposta na formação profissional, pois propõe-se reduzir para metade as poucas horas de formação atuais. E sobre a formação dos patrões o diploma é omisso  quando sabemos que é inferior à dos trabalhadores, segundo   dados do INE e das mais baixas da Europa!

Curiosamente a própria Confederação dos patrões (CIP) ignora os seus estudos (1) sobre a necessidade de requalificação dos trabalhadores portugueses. Num dos seus estudos sobre o Futuro do Trabalho podemos ler; « 52% do tempo laboral em Portugal é despendido em tarefas repetitivas e altamente automatizáveis com mais de 70% de potencial de automação»;«35% dos trabalhadores estão empregados numa área diferente da sua especialização».

Mais adiante podemos ler ainda «as nossas estimativas indicam que uma melhoria das qualificações de 10% da força de trabalho está associada a um aumento da produtividade entre 4 a 11 % por setor de atividade».

O mesmo estudo refere que face à automação 700 mil trabalhadores terão de alterar as ocupações laborais em Portugal! E ainda que 234 mil trabalhadores da zona Norte necessitarão de se requalificar.

Por acaso existe alguma proposta no sentido de melhorar a formação e requalificação dos trabalhadores portugueses nesse projeto de reforma laboral do governo? Por acaso melhora o sistema de apoio ao trabalhador-estudante? Pelo contrário, estas preocupações não apenas estão ausentes como existem propostas de reduzir o investimento nos trabalhadores na mira de dar alguns lucros às empresas no curto prazo. Existe alguma preocupação com os efeitos da automação na economia nesta proposta de revisão da legislação do trabalho? Nem sombras!

Vejamos, se 52% do tempo laboral em Portugal é despendido em tarefas repetitivas não seria de insistir numa melhor organização do trabalho e na qualificação dos trabalhadores em vez de insistir em trabalhar mais horas? Não seria importante melhorar a organização da empresa e diminuir o horário de trabalho com maior conciliação da vida profissional com a familiar? Não, quer instituir o banco de horas individual e insistir na quantidade de trabalho e pouco na qualidade do trabalho!


E a saúde e o bem estar dos trabalhadores?

 

Mas vejamos outro aspeto. Uma das maiores preocupações, inclusive dos empresários europeus, manifestada nos inquéritos ESNER da Agência Europeia para a Segurança e Saúde no Trabalho, é a subida das doenças psicológicas nos trabalhadores, nomeadamente nos jovens trabalhadores. O stresse laboral é hoje considerado, inclusive, em instituições europeias, uma espécie de pandemia que ataca todos os setores profissionais, nomeadamente altos quadros das empresas. Estudo recente da Ordem dos Psicólogos refere que 2 em 5 trabalhadores portugueses estão expostos perigosamente ao stresse. Para além do sofrimento das pessoas o custo relacionado com a perda de produtividade devida ao stresse em Portugal ultrapassa os 5 mil milhões de euros (3). Para não falar noutra epidemia que são as lesões músculo-esqueléticas que afetam mais de 50% dos trabalhadores europeus.

Por outro lado, as doenças profissionais e os acidentes de trabalho subiram nos últimos anos, incluindo os mortais, com especial incidência nas pequenas e médias empresas manifestando um retrocesso que não seria espectável. Porquê? Porque a maioria dos empresários não consideram prioritário o investimento na prevenção dos riscos profissionais nem recebem incentivos nesse sentido dos governos. Mais, quanto mais precários forem os trabalhadores menos as empresas investem nesta matéria e mais acidentes de trabalho teremos!

Por caso se vislumbram estes aspetos na proposta de lei do governo? Não, porque, diz a Ministra do Trabalho, haverá no futuro uma proposta de acordo sobre esta matéria!

Em resumo esta proposta do governo não visa a modernização do mercado de trabalho, nem a proteção dos trabalhadores e muito menos a competitividade. Não aposta na formação e requalificação para enfrentar os desafios do futuro da economia. Aposta sim, e com muita pressa, em fazer mais alguns fretes aos empresários a curto prazo sem apostas substanciais de futuro! Mostra bem de que lado está o governo Montenegro e quão pequena é a sua visão estratégica para o País!

 

(1)  O Futuro do Trabalho em Portugal da NOVA/ SBE : https://cip.org.pt/publicacoes/documentos-estrategicos/

 

(2)  Inquérito ESNER da Agência Europeia para a segurança e Saúde no trabalho: https://osha.europa.eu/pt/facts-and-figures/esener

 

(3)Prosperidade e sustentabilidades das organizações, Ordem dos Psicólogos: https://www.ordemdospsicologos.pt/ficheiros/documentos/opp_relatorio_prosperidadeesustentabilidadedasorganizacoes2023.pdf

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

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